Repetindo o que disse (escrevi) recentemente,
ninguém nunca me alertou que viver exigiria resiliência, resignação e
estoicismo, que a vida seria como uma senoide, uma montanha russa que alterna
alegria e tristeza, felicidade e sofrimento de forma tão dramática. Eu não me
preparei para suportar isso! E, podem acreditar, este desabafo não é força de expressão.
Talvez seja consequência de uma educação muito protetora que me fez crescer desfibrado,
frágil, inseguro. Como poderia ter evitado isso? Já vai saber.
Com exceção de produtos primários ou vendidos a granel, tais como pedra britada, legumes, verduras, tábuas, cordas, pregos, que estejam à temperatura ambiente ou não embalados, tudo vem com instruções sobre como consumir e onde armazenar, como instalar ou como montar – medicamentos,
televisores, móveis, celulares, etc.
Algumas instruções são verdadeiras bíblias, de tão grandes, calhamaços apresentados na forma de Manual do Proprietário e que acompanham os automóveis zero-quilômetro, por exemplo. Para ser sincero, quase nunca leio
nada – ou apenas o basicão (falha minha!).
Mas se existe algo que precisaria ser
entregue com manual de instruções detalhadíssimo são os bebês recém-nascidos. E
nem me refiro às orientações sobre alimentação, vacinas, funcionamento do
intestino. O que realmente faz falta é um manual de Vida, ensinando os pais sobre o que não fazer, ou como orientá-los diante de uma perda, ou frustração, por exemplo. Um manual que ensinasse os pais a não descarregar suas frustrações nem projetar nos pimpolhos os sonhos e desejos não alcançados. Um manual que nos
orientasse em cada etapa da existência, uma espécie de terapeuta impresso.
Meu pai e seus quatro irmãos estudaram
medicina no início do século XX para atender a um desejo da minha avó (meu pai,
pelo menos, fez isso). Quantos exerceram essa profissão? Nenhum! Imagino a
decepção vivida por minha avó. A sorte (ou azar) é que também tinham direito de
exercer a profissão de farmacêutico (naquela época podia).
Mas, à falta de um manual de Vida, todos ou
quase todos morreram na mais profunda depressão, talvez semeada por uma
educação repressora na infância. Não tenho certeza de nada disso, são apenas
especulações que fiz juntando cacos do que ouvi, tal como um paleontólogo
montando pedaços de um fóssil incompleto.
O que sei é que talvez por ter tido seus
sonhos destroçados e ser incapaz de reagir adequadamente a isso, meu pai tentou
me proteger da dureza de uma vida semelhante à dele, ao não me exigir nem cobrar dedicação
e empenho nos estudos.
Na época do vestibular, por motivo alheio à natural
disputa por uma vaga em curso concorrido, eu estudei feito um cavalo –
diariamente, obsessivamente e até nos fins de semana à noite (eu queria reatar
o namoro com a paixão da minha vida, que disse desejar me ver “careca”,
situação provocada pelos trotes sofridos pelos “calouros burros”). Mas ao me ver debruçado nas apostilas, talvez em uma noite de sábado, meu pai
me disse para não estudar tanto, que eu precisava descansar, coisas
assim.
E é com esse tipo de comportamento, baseado
na própria experiência, nas frustrações ou sonhos inatingidos que muitos pais educam
seus filhos. Se pudessem consultar o manual talvez não agissem assim – e os
filhos não cresceriam fragilizados, incapazes ou com imensa dificuldade para
pegar o touro da vida pelos chifres.
E então, que acha da ideia desse manual do que não fazer?
Talvez o ChatGPT até pudesse redigi-lo!
Ou não?
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