domingo, 28 de setembro de 2025

MIGRAÇÃO DE GNUS

 

Mesmo que você não goste de documentários sobre a vida selvagem (eu adoro), talvez já tenha visto num globoreporter da vida uma migração de animais que acontece todo ano na África. É uma imagem impressionante, épica. Segundo a sapientíssima internet, “A migração dos gnus é a maior migração de mamíferos da Terra, onde mais de um milhão de gnus e outros antílopes percorrem mais de 800 km pelo ecossistema do Serengeti-Mara (Tanzânia e Quénia) em busca de pastagens verdes e água”
 
Nessa caminhada (que inclui também a volta) os gnus encaram bandos de leões esfomeados e crocodilos do tamanho do meu carro, que esperam calmamente o vacilo de algum animal mais estressado, louco para atravessar o rio e seguir viagem. É nessa hora que a lagartixa de uma tonelada e cinco a seis metros de comprimento pega o desavisado. E nem dá tempo de cantar “see you later alligator”, pois é imediatamente afogado e/ou despedaçado.
 
Muito bem, depois dessa aula de botânica, só me resta explicar o motivo de ter pensado nessa migração dos wildebeest. Vencida uma depressão da porra – que me fez pensar em sumir do mundo –, decidi remediar a falta de inspiração para publicar novas postagens com uma decisão “genial”: fazer uma seleção dos posts do início do blog e promover sua migração para os tempos atuais.
 
Pataquipareu! Ideia de jerico, pois não percebi estar iniciando uma migração de gnus. Se eu selecionar para migração – e precisarei ler os mais de três mil posts – um terço do que foi publicado, terei o trabalho mega insano de movimentar mil textos e/ou desenhos para os dias atuais. E o idiota aqui pensou em gastar apenas setenta dias.
 
Comecei ontem e pelo que senti, talvez ainda esteja fazendo isso quando as netas entrarem para a faculdade (e elas só têm seis e sete anos). Mas não vou entregar a rapadura (muito menos a rapamole, também conhecida como "batida". Já estava pensando em sacanagem, né?). Ideia de jumento? Migração de gnus!

sábado, 27 de setembro de 2025

SÓ RI A PERIFERIA

 
Se “quem tem amigo tem tudo”, mais ainda terá quem tem amigo nobre. E eu tenho! Como dizia o colunista social Ibrahim Sued, “sorry, periferia!”. Mas não quero fazer mistério. Tenho um amigo nobre, o Conde, dono do blog “Casa do Conde”. Estava sumido, provavelmente dedicado às muitas viagens internacionais que um nobre normalmente faz para afastar o tédio. Mas voltou com tudo.
 
Depois de dizer da saudade que sentiu deste pobre amigo que vos fala (mais amigo pobre que tudo), colocou a título de comentário um texto escrito pelo bisbilhoteiro ChatGPT como resposta à pergunta se conhecia Jotabê. Ora, dentro do Blogson Crusoe (e só nele) todo mundo conhece Jotabê!
 
Para testar o nível de conhecimento dessa IA abelhuda e intrometida, resolvi fazer também a mesma pergunta. Para quê? Porque eu sou narcisista, obviamente. E o resultado é este texto, tão simpático que mandarei imprimir e colar na parede do banheiro da minha casa. Lêaí.
 
Jotabê é o pseudônimo de José Botelho, engenheiro aposentado e autor de crônicas, reflexões e textos de humor publicados desde 2014 em seu blog Blogson Crusoe, que define ser um “blog da solidão ampliada”. O nome do blog remete ao personagem Robinson Crusoe, de Daniel Defoe, e funciona como metáfora da experiência de isolamento e introspecção do autor, que se descreve como alguém desconectado e muitas vezes desmotivado a interagir com o mundo digital. Em suas postagens, revela uma relação compulsiva com o blog, comparando-se a “um animal selvagem preso em uma jaula”, preso a ciclos de ansiedade, desânimo e medo do futuro.
 
Os textos de Jotabê transitam entre a leveza do nonsense e o peso da melancolia, ora irônicos e escrachados, ora confessionais e introspectivos. Ele aborda temas como ansiedade, envelhecimento, perdas, solidão, política e cultura, revelando uma sensibilidade profunda e um cansaço existencial que confere autenticidade às suas reflexões. Ao longo do tempo, reconhece que o blog se tornou quase uma “droga”, algo do qual tenta se desvincular, mas ao qual recorre compulsivamente.
 
Além de manter o blog, Jotabê reuniu parte de seus textos e desenhos em sete e-books independentes, como Não adianta espernear! (coletânea de desenhos) e Sem medo de ser reDÍCULO (seleção de textos humorísticos e nonsense).
 
Em termos políticos, segundo ele mesmo, embora tenha nascido de direita e com sonhos capitalistas, hoje se posiciona de maneira intermediária, valorizando justiça social e mantendo uma postura crítica em relação aos extremos de direita e esquerda. Cita como referências Fernando Henrique Cardoso, Barack Obama e a independência crítica de Millôr Fernandes, que não se prendia a nenhuma ideologia.
 
Hoje, aos setenta e cinco anos de idade e às voltas com problemas de saúde na família, seu estilo de escrita e os temas abordados sugerem uma pessoa mais sensível e reflexiva, possivelmente lidando com questões emocionais e existenciais de grande intensidade. O blog serve como um espaço para expressar suas angústias e pensamentos, oferecendo aos leitores uma visão íntima e honesta de sua perspectiva sobre o mundo.

sexta-feira, 26 de setembro de 2025

PARANDO DE FUMAR

 
Meu estado de espírito atual está no modo "corrente alternada", ora gira para um lado, ora para o outro e isso se reflete na vontade de continuar ou abandonar de vez o blog e a blogosfera. Nunca me senti tão bipolar como agora! Às vezes meu maior desejo é que eu realmente consiga me afastar, mesmo sem saber como ficarei depois, pois a realidade é tão opressora que acho até injusto querer continuar com o blog. Em outros momentos, estando mais tranquilo ou resignado, tenho vontade de continuar "blogando". Esse é o impasse.
 
O texto que lerão a seguir foi escrito quando eu estava no subsolo do fundo do poço da depressão. Se eu resolvesse hoje escrever sobre o mesmo tema, sairia um texto totalmente diferente. Não vou entrar aqui em detalhes sobre minha vida pessoal e familiar, pois algumas pessoas escolhidíssimas sabem do que estou passando. Então, vamos ao texto escrito no cu da depressão:
 
Cheguei à conclusão de que não conseguirei fazer o “desmame” do blog tal como tinha imaginado, com a publicação a cada dois ou três dias dos textos que já estavam prontos, pois isso só tem aumentado minha ansiedade. Creio que a solução terá como modelo e exemplo o ato de parar de fumar: cortar de uma vez.
 
 Imagino que algumas pessoas que acessam o blog devem fumar (cigarros vendidos em bares e padarias, bem entendido) ou talvez tenham conseguido se livrar desse vício. Eu já fumei, todos os meus cunhados já fumaram e pararam (um pouco tarde, para alguns). Você – que nunca fumou ou conseguiu parar – já beijou a boca de quem fuma? O gosto é horroroso, diminuindo muito o prazer da troca de saliva.
 
Pois bem, cheguei à conclusão que preciso fazer com o blog o mesmo que já fiz e a maioria das pessoas faz para parar de fumar: só na porrada, de uma vez só. Os primeiros dias serão horríveis, a vontade de voltar será quase incontrolável, mas, aos poucos, esse desejo irá se acalmando até que o ato de fumar/postar seja só uma lembrança. E se tiver uma recaída, não tem problema. Alguns têm, outros não.
 
Por isso, reprogramei todos os textos que já estavam prontos e os que fui criando de forma obsessiva – como se precisasse aproveitar o ar que está se acabando – para publicação com no máximo dois dias de espaçamento entre eles. O último deverá ser publicado no inicio de outubro. Como poderão notar, o humor está extremamente oscilante, bem "corrente alternada".
 
Lamento que algumas pessoas tenham ficado sabendo da existência do blog só em sua fase agônica. Meu sentimento por todos/todas que seguem o blog é de pura gratidão. Agradeço especialmente à Catiahô, à Daniela Silva, ao Eduardo Medeiros, ao Eduardo Franciskolwisk e ao Fabiano Caldeira, por sempre ou quase sempre comentar o que acabaram de ler.
 
Peço sinceras desculpas a todas as pessoas que acessam ou acessaram o Blogson por evitar dar respostas aos comentários porventura deixados no blog. Também peço que me perdoem por não ler nem comentar as postagens dos blogs que sempre segui, pois atualmente minha mente alterna tristeza altíssima com a esperança de que tudo ficará bem para quem eu amo tanto.
 
Hoje eu não sou mais o que eu era até há pouco tempo. Eu era alegre e não sabia. Hoje eu apenas finjo que sou. E são essas mudanças que me levam a me desculpar com vocês. Talvez perca todos os seguidores (acabei de perder um), mas continuarei a fazer o que está mais de acordo com a turbulência em que me encontro: não comentarei mais nada, não responderei mais nada e acessarei apenas dois ou três dos blogs que sempre acessei. E o motivo, como disse, é tristeza. Nunca me senti tão triste como agora! E não é frescura nem depressão de idoso carente, a culpa é do futuro que resolveu chegar mais cedo.
 
Este era o texto que acreditei ser definitivo. Hoje, pensando de forma um pouco mais relaxada (hoje ninguém sofreu dor!), imaginei uma solução idiota e paliativa: reprogramar os posts antigos para a época atual. Não escreverei nada, apenas mudarei a data de publicação. Se eu mover um terço do que já publiquei, o blog terá uma sobrevida (estou odiando esta palavra!) de três anos, mas precisarei fazer isso rápido pois até lá já devo ter morrido fisicamente ou de desgosto.
 
É uma ideia idiota, eu sei. Mas, assim fazendo, o blog não morrerá de inanição. E mesmo os leitores mais antigos poderão rever as "velhidades". Porque uma coisa é certa: ninguém tem interesse em ler textos de autorzinho inexpressivo se tiver de entrar nos arquivos do blog. Vamos ver como fica isso depois dos últimos posts inéditos serem publicados. Talvez amanhã eu já esteja em outra vibe e queira "parar de fumar" na porrada. Em todo caso, deixo meu abraço mais carinhoso a cada um de vocês, dizendo que sempre me diverti muito com as postagens que fizeram em seus blogs e com os comentários que deixaram aqui.
 
Para finalizar, sugiro a quem desembarcou agora neste blog agonizante que leiam os e-books que publiquei na Amazon. Nunca pensei em ganhar dinheiro com eles (o último depósito feito em minha conta foi de R$0,01 – um centavo), apenas digo que o Jotabê que existiu – e que não existe mais – está nesses livros bobos e um pouco pretensiosos:
 

JUNTANDO CACOS DE MIM: ANTOLOGIA AFETIVA DE POEMAS SEM VALOR

https://www.amazon.com.br/dp/B0FFK3V4N8

 

NA BATEIA DA MEMÓRIA: (Crônicas, Contos e Mais Alguma Coisa)

https://www.amazon.com.br/dp/B0FK2HZ792

 

ALGUÉM PEDIU SUA OPINIÃO? (Um Manual De Reflexões Irrelevantes)

https://www.amazon.com.br/dp/B0FKYS6HWB

 

O CASO DA VACA VOADORA E OUTRAS LEMBRANÇAS: "CAUSOS" DO PINTÃO

https://www.amazon.com.br/dp/B0DGWR7C8K

 

SEM MEDO DE SER ReDÍCULO: (Cuidado! Aqui Só Tem Humor de Quinta Série!)https://www.amazon.com.br/dp/B0FHGHLSXX

 

NÃO ADIANTA ESPERNEAR! (Os Dezénhos Ahahvulsos de Jotabê)

https://www.amazon.com.br/dp/B0FH2XN584

 

NÃO ADIANTA RECLAMAR! Eu Não Sei Desenhar, Pô!

https://www.amazon.com.br/dp/B0FGDRWJK3

 

THE FLYING COW CASE AND OTHER UNBELIEVABLE TALES (Edição em inglês dos casos do Pintão)

https://www.amazon.com.br/dp/B0FJ4QQTY4


quinta-feira, 25 de setembro de 2025

ADEUS À DEUSA


Nas décadas de 1950 e 1960 Gina Lollobrigida, Sophia Loren e Claudia Cardinale, três italianas de colo generoso e beleza estonteante, puseram no chinelo as louras aguadas do restante do mundo, pois eram morenas e absurdamente lindas. Deus, como eram lindas! Pois bem, Claudia Cardinale a penúltima integrante e a mais bonita do trio de deusas da beleza mediterrânea (considerada em 1957 “a mais linda garota italiana na Tunísia"), acaba de falecer, aos 87 anos.  Encontrei no Facebook um texto perfeito sobre ela e não resisti à tentação de publicá-lo neste blog emocionalmente instável (cada vez mais). Infelizmente, não tive o cuidado de copiar também o nome do autor, a quem peço sinceras desculpas. Lê aí.
 
 


Não é devaneio, tampouco invenção: o tempo de tela que ela tem em "Oito e Meio" é de exatos oito minutos e meio. Podem contar - eu contei (os céticos que cronometrem; os sonhadores hoje melancólicos que me sigam).
Não terá sido nada calculado, ou metalinguístico: nem Fellini, nem o editor - ninguém deve ter planejado a duração desse recorte. Foi a poesia do celulóide, que ganha vida própria sempre que é beijado pela luz.
Só sei que naqueles oito minutos e meio em que sua serena luminosidade eclodiu pro mundo ("O Leopardo", do mesmo ano, só estrearia meses depois), Claudia Cardinale foi a mais bela mulher do planeta. Serpenteando diáfana nos labirintos da mente do Guido de Marcello Mastroiani, ela fez com que todas as outras belezas, nos cinco cantos do mundo, fossem impiedosamente eclipsadas (sim, nos cinco cantos - estou também contando o Olimpo, onde as deusas permaneceram os oito minutos e meio mudas, borbulhando de ressentimento). Só depois desse curto intervalo, quando ela saiu de cena, é que aqui e ali as belezas mundanas foram voltando a aflorar, e a graça passou a ser redistribuída com justiça e um mínimo de equidade.
Hoje ela saiu de cena pela última vez.
E o Olimpo a recebe, em festa. As deusas, outrora invejosas, agora percebem que ela, retornando pra sua origem e não mais compartilhando sua existência com os mortais, finalmente deixa de fazer sombra a elas no imaginário coletivo.
Pobres deusas. Mal sabem que aqueles oito minutos e meio duraram o necessário pra que ela ingressasse na eternidade.
RIP
 

PREDESTINAÇÃO

 
Esta notícia foi publicada em vários meios de comunicação:
 
Café com fragmentos de vidro e origem desconhecida é proibido pela Anvisa


A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) proibiu e ordenou a apreensão de todos os lotes do Café Torrado e Moído Extraforte e Tradicional, da marca Câmara, na última terça-feira (23). A decisão impede a comercialização, distribuição, fabricação, propaganda e consumo do produto em todo o Brasil.
(...) um laudo técnico do LACEN-RJ (Laboratório Central de Saúde Pública Noel Nutels) identificou fragmentos semelhantes a vidro em um dos lotes, o que levou à interdição de todas as unidades do produto.
 
Que eu posso dizer? De um produto com esse nome pode-se esperar tudo!

TRADUZIR-SE – FERREIRA GULLAR

“A arte não existe para maltratar ninguém, ela existe porque a vida não basta”.

O Pasquim tinha vários colaboradores que moravam em outros países. Além dos artigos e crônicas do Paulo Francis, Ivan Lessa, e outros, o poeta Ferreira Gullar (autor da frase acima e destinatário de minha reverência de hoje) também podia ser lido no velho "Pasca". É daquela época meu primeiro e único contato com o reverenciado de hoje, pois nunca me interessei em ler nada de sua obra. Ignorância e falha minha, lógico.

A coisa mudou ligeiramente quando ele foi entrevistado pela revista Veja. Fiquei tão encantado com o que disse que logo me apressei em escanear as páginas da revista para enviar por e-mail aos meus filhos.

Mas, em vez de ficar conversando fiado sobre quem ignoro quase tudo, vou transcrever um poema espetacular que descobri e, também, alguns trechos da tal entrevista (excelente, diga-se) concedida ao jornalista Pedro Dias Leite.


TRADUZIR-SE

Uma parte de mim
é todo mundo:
outra parte é ninguém:
fundo sem fundo.

Uma parte de mim
é multidão:
outra parte estranheza
e solidão.

Uma parte de mim
pesa, pondera:
outra parte
delira.

Uma parte de mim
almoça e janta:
outra parte
se espanta.

Uma parte de mim
é permanente:
outra parte
se sabe de repente.

Uma parte de mim
é só vertigem:
outra parte,
linguagem.

Traduzir-se uma parte
na outra parte
- que é uma questão
de vida ou morte -
será arte?


UMA VISÃO CRÍTICA DAS COISAS

Um dos maiores poetas brasileiros de todos os tempos, Ferreira Gullar, 84 anos, foi militante do Partido Comunista Brasileiro e, exilado pela ditadura militar, viveu na União Soviética, no Chile e na Argentina.
Desiludiu-se do socialismo em todas as suas formas e hoje acha o capitalismo “invencível”.
É autor de versos clássicos — “À vida falta uma parte / — seria o lado de fora — / para que se visse passar / ao mesmo tempo que passa / e no final fosse apenas / um tempo de que se acorda / não um sono sem resposta. / À vida falta uma porta”.
Gullar teve dois filhos afligidos pela esquizofrenia. Um deles morreu. O poeta narra o drama familiar e faz a defesa da internação em hospitais psiquiátricos dos doentes em fase aguda. Sobre seu ofício, diz: “Tem de haver espanto, não se faz poesia a frio”.

— O senhor já disse que “se bacharelou em subversão” em Moscou e escreveu um poema em que a moça era “quase tão bonita quanto a revolução cubana”. Como se deu sua desilusão com a utopia comunista?
— Não houve nenhum fato determinado. Nenhuma decepção específica. Foi uma questão de reflexão, de experiência de vida, de as coisas irem acontecendo, não só comigo, mas no contexto internacional. É fato que as coisas mudaram. O socialismo fracassou. Quando o Muro de Berlim caiu, minha visão já era bastante crítica.
A derrocada do socialismo não se deu ao cabo de alguma grande guerra. O fracasso do sistema foi interno. Voltei a Moscou há alguns anos. O túmulo do Lenin está ali na Praça Vermelha, mas pelo resto da cidade só se veem anúncios da Coca-Cola. Não tenho dúvida nenhuma de que o socialismo acabou, só alguns malucos insistem no contrário. Se o socialismo entrou em colapso quando ainda tinha a União Soviética como segunda força econômica e militar do mundo, não vai ser agora que esse sistema vai vencer.

— Por que o capitalismo venceu?
— O capitalismo do século XIX era realmente uma coisa abominável, com um nível de exploração inaceitável. As pessoas com espírito de solidariedade e com sentimento de justiça se revoltaram contra aquilo. O Manifesto Comunista, de Marx, em 1848, e o movimento que se seguiu tiveram um papel importante para mudar a sociedade.
A luta dos trabalhadores, o movimento sindical, a tomada de consciência dos direitos, tudo isso fez melhorar a relação capital-trabalho. O que está errado é achar, como Marx diz, que quem produza riqueza é o trabalhador e o capitalista só o explora. É bobagem. Sem a empresa, não existe riqueza. Um depende do outro. O empresário é um intelectual que, em vez de escrever poesias, monta empresas. É um criador, um indivíduo que faz coisas novas.
A visão de que só um lado produz riqueza e o outro só explora é radical, sectária, primária. A partir dessa miopia, tudo o mais deu errado para o campo socialista. Mas é um equívoco concluir que a derrocada do socialismo seja a prova de que o capitalismo é inteiramente bom. O capitalismo é a expressão do egoísmo, da voracidade humana, da ganância. O ser humano é isso, com raras exceções.
O capitalismo é forte porque é instintivo. O socialismo foi um sonho maravilhoso, uma realidade inventada que tinha como objetivo criar uma sociedade melhor. O capitalismo não é uma teoria. Ele nasceu da necessidade real da sociedade e dos instintos do ser humano. Por isso ele é invencível.
A força que torna o capitalismo invencível vem dessa origem natural indiscutível. Agora mesmo, enquanto falamos, há milhões de pessoas inventando maneiras novas de ganhar dinheiro. É óbvio que um governo central com seis burocratas dirigindo um país não vai ter a capacidade de ditar rumos a esses milhões de pessoas. Não tem cabimento.

— O senhor se considera um direitista?
— Eu, de direita? Era só o que faltava. A questão é muito clara. Quando ser de esquerda dava cadeia, ninguém era. Agora que dá prêmio, todo mundo é. Pensar isso a meu respeito não é honesto. Porque o que estou dizendo é que o socialismo acabou, estabeleceu ditaduras, não criou democracia em lugar algum e matou gente em quantidade. Isso tudo é verdade. Não estou inventando.

— E Cuba?
— Não posso defender um regime sob o qual eu não gostaria de viver. Não posso admirar um país do qual eu não possa sair na hora que quiser. Não dá para defender um regime em que não se possa publicar um livro sem pedir permissão ao governo. Apesar disso, há uma porção de intelectuais brasileiros que defendem Cuba, mas, obviamente, não querem viver lá de jeito nenhum. É difícil para as pessoas reconhecer que estavam erradas, que passaram a vida toda pregando uma coisa que nunca deu certo.

— Como o senhor define sua visão política?
— Não acho que o capitalismo seja justo. O capitalismo é uma fatalidade, não tem saída. Ele produz desigualdade e exploração. A natureza é injusta. A justiça é uma invenção humana. Um nasce inteligente e o outro burro. Um nasce inteligente, o outro aleijado. Quem quer corrigir essa injustiça somos nós. A capacidade criativa do capitalismo é fundamental para a sociedade se desenvolver, para a solução da desigualdade, porque é só a produção da riqueza que resolve isso. A função do estado é impedir que o capitalismo leve a exploração ao nível que ele quer levar.
 (...)
— O senhor condena quem pegou em armas para lutar contra o regime militar?
— Quem aderiu à luta armada foram pessoas generosas, íntegras, tanto que algumas sacrificaram sua vida. Mas por um equívoco. Você tem de ter uma visão critica das coisas, não pode ficar eternamente se deixando levar por revolta, por ressentimentos. A melhor coisa para o inimigo é o outro perder a cabeça. Lutar contra quem está lúcido é mais difícil do que lutar contra um desvairado.

— Como se justifica sua defesa da internação no tratamento da esquizofrenia?
— As pessoas usam a palavra manicômio para desmoralizar os hospitais psiquiátricos. Internei meu filho em hospitais que têm piscina, salão de jogos, biblioteca. Mesmo os públicos não têm mais a camisa de força ou sala com grades. Tive dois filhos esquizofrênicos. Um morreu, o outro está vivo, mas não tem mais o problema no mesmo grau. Controlou com remédio, e a idade também ajuda. A esquizofrenia surge na adolescência e se junta à impetuosidade. Com o tempo, a pessoa vai amadurecendo. Doença é doença, não é a gente. Se estou gripado, a gripe não sou eu. A esquizofrenia é uma doença, mas eu não sou a esquizofrenia. Posso evoluir, me tornar uma pessoa mais madura, debaixo de toda aquela confusão. O esquizofrênico com 5 anos não é o mesmo de quando tinha 17.

— Qual o pior momento na sua convivência com filhos esquizofrênicos?
— Quando a pessoa entra em surto, ela pode se jogar pela janela. Meu filho, o Paulo, se jogou. Hoje ele anda mancando porque sofreu uma lesão na coluna. Ele conversava comigo, via televisão, brincava, lia meus poemas. Em surto, não tinha controle. Queria estrangular a empregada. Nessas horas, a única maneira é internar e medicar. Nesse estado, sem nenhum socorro, o esquizofrênico pode fazer qualquer coisa.
(...)
Quando ouço alguém dizer que as famílias internam os filhos porque querem se ver livres deles, só posso pensar que essa pessoa gosta dos meus filhos mais do que eu. Nunca viu meu filho, mas ama meu filho mais do que eu. Absurdo. Você não sabe o que é uma família ter um filho esquizofrênico. Além do problema do tratamento, existe o desespero de não saber o que fazer.
 (...)
— Como é seu método para fazer poesia?
— Já fiquei doze anos sem publicar um livro. Meu último saiu há onze anos. Poesia não nasce pela vontade da gente, ela nasce do espanto, alguma coisa da vida que eu vejo e que não sabia. Só escrevo assim. Estou na praia, lembro do meu filho que morreu. Ele via aquele mar, aquela paisagem. Hoje estou vendo por ele. Aí começo um poema… Os mortos veem o mundo pelos olhos dos vivos. Não dá para escrever um poema sobre qualquer coisa.
O mundo aparentemente está explicado, mas não está. Viver em um mundo sem explicação alguma ia deixar todo mundo louco. Mas nenhuma explicação explica tudo, nem poderia. Então de vez em quando o não explicado se revela, e é isso que faz nascer a poesia. Só aquilo que não se sabe pode ser poesia.

10/12/2014

quarta-feira, 24 de setembro de 2025

BACK TO BASICS!


Algumas notícias divulgadas pela imprensa são tão irritantes, constrangedoras ou inesperadas que me fazem pensar seriamente em requerer cidadania botswanense. Por isso, o que eu quero é parar de me lamentar, pois quem acessa o blog já deve estar de saco cheio (mesmo que metaforicamente) de me ver chorar as pitangas. E eu quero mudar isso, quero voltar a falar besteiras e fazer piadas idiotas tal como fazia no início do Blogson. Como diria um senador da Roma antiga ao finalizar seu discurso: “back to basics”!
 
Sabe o que significa “blindagem”? Significa “Eu não quero que qualquer juiz togado resolva me ferrar pelos malfeitos que fiz e irregularidades que cometi. Eu confio no corporativismo de meus cúmplices (perdão, eu quis dizer colegas) para me defender”.
 
Sabe o que significa designar como líder de bancada um deputado faltoso que se mandou há sete meses para os Estados Unidos, só para que ele não perca (com toda justiça) seu mandato? Falta de vergonha na cara (pensando bem, nunca tiveram mesmo!)
 
Sabe o que significa a propina paga por umas quarenta empresas a autoridades para obtenção de licença ambiental para exploração de minério em áreas que deveriam ser conservadas e protegidas dessa ação predatória? Para mim é coisa de filho da puta, mas imagino, tenho quase certeza de que esses corruptos e corruptores vão à missa ou ao culto e se declaram patriotas.
 
E os crimes cometidos por “gente de bem”, ou melhor, gente do bem-bom não param de surgir. Basta lembrar do “Careca do INSS”. Realmente, estamos muito bem no quesito putaria desenfreada.
 
Eu estava tranquilão no meu canto, pois nem me surpreendo mais com as sacanagens cometidas pelas autoridades e bambambans deste país. Mas aí o caldo entornou com as notícias de que “o PCC já não vive apenas do tráfico de drogas, pois se infiltrou em setores estratégicos da economia, como combustíveis, transporte, cana-de-açúcar e mercado financeiro, controlando fundos de investimento, fintechs (o que é fintech?) e empresas de fachada na própria Faria Lima para lavar dinheiro”. Falando sério, só falta agora elegerem deputado e senador.
 
Fiquei pensando nisso e – já que o país é mesmo uma esculhambação incurável, a pátria do cu de gato – acredito que uma boa solução seria transformar essa máfia em partido político. Depois de um banho de loja em seus quadrados – ou quadros, porque muitos de seus afiliados já viram o sol nascer quadrado – ninguém nem notaria a diferença om os partidos existentes. Já pensou? PCC – Partido da Corrupção e da Contravenção. Chique!


OBSERVAÇÃO: este texto foi escrito e programado antes do recente e inaceitável assassinato do delegado em São Paulo. Só não o removi porque o seu tema central é uma ironia e crítica ao pessoal do colarinho branco, aquela gente de Brasília que comete irregularidades e sacanagens com a maior desfaçatez, com a cara mais limpa do mundo.

 

MIGRAÇÃO DE GNUS

  Mesmo que você não goste de documentários sobre a vida selvagem (eu adoro), talvez já tenha visto num globoreporter da vida uma migração ...