terça-feira, 21 de janeiro de 2025

POESIA INFANTIL

Há tempos deixei de me aventurar a musicar meus poemas sem rima com o auxílio da incontrolável IA Suno. E o motivo é simples: essa inteligência artificial – ao menos em sua versão gratuita – não é nada dócil. Ela cria o que lhe dá “na tela” (boa essa!) e não aceita ajustes. O infeliz que não gostar do resultado terá de se contentar em pedir outra versão, respeitando o limite diário de cinco solicitações.
 
Mesmo assim, resolvi um dia brincar com minhas netinhas, escrevendo um poema em que elas e seus pais eram mencionados. A cara de espanto que fizeram ao ouvir pela primeira vez seus apelidos citados nessa música vez foi muito engraçada.
 
Tempos depois, fiquei sabendo que pediam aos pais para escutar novamente essa musiquinha. Uma das gêmeas mais velhas me surpreendeu ao dizer que já sabia quase toda a letra (é por isso que os pais devem ficar atentos ao que seus filhos ouvem ou assistem, pois tem muito lixo rolando por aí).
 
Acho que nunca publiquei essa música aqui no blog pois ainda tento preservar a intimidade de minha família, seja usando apenas apelidos ou nem mesmo isso.
 
Mas ontem, descobri em uma gaveta um pendrive esquecido, que além dessa musiquinha, tinha também minhas experiênciasa com a SUNO. Decidi colocá-las para tocar no carro enquanto atravessava a cidade para comprar material elétrico na Leroy Merlin. O resultado dessa audição me fez mudar de ideia, e agora resolvi compartilhar essa despretensiosa poesia infantil aqui no blog.
 
 
Eu era um moço sozinho
Sem ninguém com quem sonhar
Mas aconteceu de alguém me achar
E quisesse me namorar.
 
Naquele dia meu coração vazio
Foi ocupado por ela, linda Lily
Como dos contos de fada princesa.
E que aceitou comigo casar
 
E logo vieram os meninos
Tio Gu, Tio Binho, Tio Bê e Tio Dani
Todos bem pequenininhos
 
E meu coraçãozinho
Quis crescer só um pouquinho
Pra nele caber todo mundo
Pra nunca mais ficar sozinho
 
O tempo passou e os meninos
Agora todos grandinhos
Começaram a namorar.
 
Tia Fê veio com o Gu,
Tia Ceci com o Bê,
Tia Gi veio com o Fabinho 
O Dani não trouxe ninguém
Pois resolveu ficar sozinho
 
E o coração cresceu mais um pouco
Ficando bonito, uma jóia
Mas faltava tudo iluminar
 
Então a Tia Ceci e Tio Bê
Trouxeram a Bia e a Cacá
Tia Gi e o tio Binho
Trouxeram a Lulu e a Lelê
 
E aquele coraçãozinho,
Que foi tão vazio e tristinho
Cresceu, ficou grandão
Com tanto amor e carinho
 
Vovó Lily, Tio Gu e Tia Fê,
Tia Ceci e Tio Bê,
Tia Gi e Tio Binho e tio Dani sozinho
Mais a Bia e a Cacá, a Lulu e a Lelê
 
Todos moram no meu coração
E esta história tão bonita,
Tão boa de ser contada
Merece agora esta canção.


segunda-feira, 20 de janeiro de 2025

CORDIAIS SAUDAÇÕES

Suzana Flag,
Estimo que este mal traçado post, em estilo rude, na intimidade, vá te encontrar gozando saúde na mais completa felicidade.
 
Imagino que poucas pessoas conheçam estes versos escritos pelo genial Noel Rosa. Resolvi utilizá-los de forma descontraída para apresentar este post – uma leitura árida mas também muito esclarecedora –, cujo objetivo é desfazer mal-entendidos e interpretações equivocadas. Antes de mergulharmos no conteúdo do texto de hoje, deixo uma curiosidade: esses versos foram extraídos da música "Cordiais Saudações”, no qual a palavra “post” substituiu "samba” na letra original.
 
Existem pessoas que aparentam guardar o rancor na geladeira, só para que ele se conserve mais. Uma dessas é "Suzana Flag", que às vezes dá as caras por aqui só para fazer comentários deste tipo: "q orgulho ein senhor? q orgulho de ajudar um ladrão ser d novo presidente. q orgulho ein senhor? sua imunização cognitiva foi um suceso". Aparentemente não consegue entender e se enfurece por eu ter votado no Lula e não no Bozo e mais ainda por eu afirmar que nunca mais o "mito" receberá meu voto (pois já votei nele uma vez!). Mas o "Nelson" é gente boa.
 
Dia desses fui chamado por ele de velho descarado, sem um pingo de caráter ou hombridade. Sem um pingo de vergonha na cara”, uma pessoa que “Finge ser um bom velhinho mas é tão sujo quanto o Lula”. Talvez eu devesse ficar zangado ou magoado diante de tão severas ofensas, mas confesso que nada disso me incomoda. Afinal, como dizem, “o que vem de baixo não me atinge” – e aqui, “de baixo” significa “debaixo da terra”. Explico: Suzana Flag, a/o autora/or dessas ofensas, é um dos pseudônimos do falecido Nelson Rodrigues, jornalista e teatrólogo notório por seu conservadorismo.
 
Portanto, ou essas críticas ultraconservadoras vêm de alguém que se esconde atrás desse simpático pseudônimo, ou estou recebendo mensagens do além, diretamente do próprio Nelson. Talvez como gesto de deferência, já que não deve demorar muito para que eu e ele possamos bater um papo cara a cara, olho no olho – ou, melhor dizendo, crânio a crânio, órbita a órbita.
 
Mas deixando os mortos em paz (por enquanto), devo esclarecer que sou pobre, mas limpinho. Se não fosse, preferiria mil vezes ser sujo como o Lula que limpo e asseado como o Bozo e seu ídolo Trump (coincidentemente condenado e livre da prisão, tal como nosso presidente nove dedos).
 
Falando com toda pureza de coração, uma coisa que sempre me incomodou no Direito é a anulação de provas ou a prescrição de crimes por conta de filigranas que nós, leigos — eu e “o” Suzana Flag incluídos – temos dificuldade ou má vontade em entender. Por isso, resolvi pesquisar na internet o que realmente aconteceu com o nosso atual presidente. Quanto ao outro, o do cabelo de milho, quero mais é que se foda, pois nada devo a ele.
 
E assim, encontrei opiniões e pareceres técnicos que ajudam a explicar essa – na minha modesta visão de leigo – aberração jurídica. Para quem tiver saco (no sentido figurado, é claro), seguem alguns excertos de uma reportagem publicada no portal UOL em outubro de 2022, com grifos meus.

Mas uma coisa precisa ser dita, meu caro Suzana Flag: eu lamentei muito quando a condenação do Lula foi anulada. Em compensação, fiquei muito feliz que sua "descondenação" tenha impedido a reeleição de um sujeito desprezível e de extrema direita. O nome disso é pragmatismo, entende? E agora, se quiser, leia os comentários de juristas super qualificados.

 
Condenado em dois processos da operação Lava Jato — razão pela qual chegou a ficar 580 dias preso e teve sua candidatura barrada nas eleições de 2018 —, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) voltou à condição de inocente em 2021, com a anulação das condenações pelo STF (Supremo Tribunal Federal) A anulação se baseou em dois entendimentos da corte: de que o juiz Sérgio Moro foi parcial, o que comprometeu o direito da defesa a um julgamento justo, e de que os casos tramitaram fora da jurisdição correta
 
"A imparcialidade do juízo é um pressuposto básico e irrenunciável de tudo que se faz num processo. E foi essa imparcialidade que foi derrubada. E os fatos mais recentes, o envolvimento político do juiz Moro, acabaram tornando essa narrativa quase que indissociável de tudo que aconteceu", afirma a professora da FGV-Rio e procuradora regional da República Silvana Batini.
 
A distinção entre inocente e inocentado faz sentido?
A suspeição de Moro inviabilizou qualquer análise sobre a culpabilidade do ex-presidente, já que as provas produzidas e os processos foram considerados comprometidos, daí a anulação deles pelo Supremo. Por esse motivo, não é tecnicamente correto falar que Lula foi absolvido ou inocentado nesses casos específicos, já que não houve um julgamento válido -- é nessa tecla, a de que não houve absolvição, que batem críticos do petista.
 
Isso, porém, não faz dele alguém menos inocente aos olhos da Justiça, na avaliação de especialistas. No regramento jurídico brasileiro vale a presunção da inocência. A Constituição diz, no Artigo 5º, que "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória". Em outras palavras: todos são inocentes até que se prove o contrário por um julgamento definitivo, contra o qual não caiba mais recurso. É este o caso de Lula, contra quem não há, desde a anulação dos processos da Lava Jato em 2021, mais nenhuma sentença válida.
 
Batini explica que a inocência não é um atestado a ser conquistado nos tribunais, e sim algo que se pressupõe de todos. "[A absolvição] não é um juízo que concede um status para a pessoa. Inocente somos todos até uma sentença condenatória transitar em julgado. Lula não precisa de uma sentença absolutória [que o absolva] para isso. É o contrário: para ele deixar de ser inocente é que precisaria de uma sentença condenatória."
 
Diretor da Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getulio Vargas, Oscar Vilhena Vieira diz ver uma confusão entre o uso popular do termo inocência e o seu significado jurídico.
 
"As pessoas acham que ele não foi inocentado [porque] não teve sentença de absolvição", afirma. "O debate público se apropria de uma palavra para atribuir algum tipo de virtude moral às pessoas e [alguns] usam isso contra seus inimigos políticos. Quer se fazer a inversão do ônus narrativo: já que não houve uma sentença de absolvição, então ele é culpado. Mas o que o direito diz é: já que não houve sentença condenatória, ele deve ser presumidamente inocente."
 
Tanto Batini quanto Vilhena dizem que, do ponto de vista jurídico, não faz sentido distinguir entre absolvição e inocência. "A distinção é mais importante no plano político do que no plano jurídico", afirma a docente da FGV-Rio. "Já a exploração política [do tema] pelo adversário me parece que é inevitável."
 
"Do ponto de vista político, tem que ficar muito claro que as acusações que foram feitas contra Lula não prosperaram na Justiça. Então, sobre aqueles fatos, ele é inocente. Se houver alguma outra coisa, alguma discussão, que seja feita. Mas sobre aqueles fatos, ele é inocente", frisa Pierpaolo Bottini, advogado criminalista e professor de direito da USP (Universidade de São Paulo).
 
O que pesa contra o ex-presidente
Segundo levantamento da agência de checagem Aos Fatos, Lula foi formalmente inocentado de três acusações na Justiça: de tentar comprar o silêncio de um ex-diretor da Petrobras, de formação de organização criminosa e de aprovar uma medida provisória para favorecer empresas em troca de propina.
Os demais 23 casos são inquéritos arquivados e denúncias rejeitadas por prescrição (quando esgota o prazo previsto em lei para processar alguém), falta ou nulidade de provas, inépcia (quando a peça apresentada não atende aos requisitos legais), além de ações suspensas ou trancadas -- inclusos aí o tríplex do Guarujá e o sítio em Atibaia, que em 2021 voltaram à estaca zero e, meses depois, prescreveram. No caso das acusações que prescrevem, Lula não pode mais ser julgado.
 
"Acho que as pessoas têm razão em ficar incomodadas com a anulação dos processos. Mas se as autoridades desde o início seguissem a regra legal e não buscassem a condenação a qualquer custo, nada disso teria acontecido", completa Bottini. "Na medida em que as regras claras não foram respeitadas desde o início, cria-se essa sensação de impunidade. Mas acho que isso é um problema muito mais de quem julgou os processos do que de quem exerceu a defesa e alegava isso desde o início."

 

domingo, 19 de janeiro de 2025

UMA FOLHA EM BRANCO

Creio que foi na década de 1980, quando a jornalista Leda Nagle ainda apresentava um telejornal da Globo aos sábados, que fiquei sabendo da existência de Lair Ribeiro. Eu sempre digo que engenheiro faz qualquer coisa para ganhar dinheiro. E o Dr. Lair Ribeiro é o equivalente na área médica do engenheiro, pois além de cardiologista de formação, é também “escritor de livros de autoajuda, nutrólogo e palestrante”. Mas naquela época eu só fiquei sabendo que era um cardiologista explicando os mecanismos e sutilezas do cérebro humano.
 
Segundo ele, o cérebro humano "trabalha" de forma distinta as metas e os sonhos. Sonhos expressam desejos que não têm prazo para acontecer, não têm quantidades, são pensamentos oníricos, sem conexão clara com a realidade. Quando alguém diz que morre de vontade de viajar para a Europa provavelmente morrerá antes de atingir esse objetivo. Já uma meta, segundo o médico, é algo que prepara o cérebro para a ação, pois envolve prazos e objetivos claros.
 
Nesse ponto a jornalista disse que desejava ganhar muito dinheiro no próximo ano e perguntou se isso era uma meta. O médico disse que para o cérebro "muito dinheiro" pode ser apenas um dólar a mais do que foi ganho no ano anterior (ele só falava em dólar). E que seria necessário ser mais explícita.
 
Voltando ao desejo de viajar para a Europa detalhou o que seria uma meta: Em que período do ano se pretende viajar; quais ou qual país se deseja conhecer; quantos dias imagina-se a duração da viagem; quantos dólares será preciso levar; onde se pretende hospedar, e assim por diante. E foi detalhando minuciosamente a meta.
 
Finalizando a entrevista, sugeriu que a jornalista e os ouvintes pegassem uma folha de "papel almaço" e anotassem metas de curto, médio e longo prazo, detalhando cada uma, para que o cérebro se preparasse para atingi-las. Confesso que fiquei vivamente impressionado com a entrevista e com a sensatez dos ensinamentos.
 
Tempos depois eu descobri que ele era um cardiologista que se desgarrou de sua formação profissional para vender livros e cursos motivacionais e de autoajuda, além de fascículos colecionáveis em bancas de revista. Vou me abster de dizer se considero picaretagem esse tipo de atividade, mas uma coisa precisa ser dita: nunca duvidei das orientações dadas durante aquela entrevista, pois pouco tempo depois, ainda entusiasmado com o que tinha ouvido e aprendido,  peguei uma folha de papel para escrever algumas metas e desejos. O primeiro e mais importante item seria criar uma empresa de engenharia, uma construtora.
 
Sentado à mesa da sala de jantar, caneta na mão, fiquei ali olhando a folha em branco, pronta para receber as anotações necessárias. Que nunca foram feitas.  Descobri naquele momento que se eu anotasse o meu desejo de ser dono de uma construtora, mesmo que fosse uma microconstrutora, precisaria começar a tomar providências para torná-lo realidade. E descobri que esse sonho por tanto tempo acalentado era apenas isso, um sonho.

sexta-feira, 17 de janeiro de 2025

A VOZ DE DEUS

Certa vez, Elis Regina afirmou que “Se Deus cantasse, ele cantaria com a voz de Milton Nascimento.” E ela tinha razão. Porém, acredito que, em um momento único, Deus decidiu cantar de fato.

Foi durante um show de Chico Buarque e Milton Nascimento. Na introdução de “O que será, Deus, quem sabe, se incorporou no Bituca e executou a vocalize inicial da canção. Depois, silenciosamente, devolveu a voz ao Milton, sem que ninguém percebesse.

Aquela interpretação divina foi tão sublime que umedeceu os olhos de um Chico Buarque embasbacado e emocionado.

Se fui herético agora ou não, pouco importa, pois tudo o que eu quis foi chamar a atenção dos leitores para ouvir essa estonteante apresentação, gravada em 1987, ainda no tempo em que Milton realmente cantava com a voz de Deus.

quarta-feira, 15 de janeiro de 2025

"E SE?"

 
Quantas escolhas erradas já fizemos, quantas decisões equivocadas já tomamos durante a vida? Talvez a estatística ou outra ciência possam explicar que quanto mais longa nossa vida for, mais chances teremos de errar, pois diariamente, a cada hora, quase a cada minuto somos forçados a tomar decisões de que eventualmente nos arrependeremos depois.
 
E sempre fica na boca aquele gosto amargo do arrependimento quando no cérebro surge aquela terrível pergunta “E se ...?" Por conta disso e por já ter errado – e me arrependido – centenas de vezes, resolvi desconstruir e brincar com “If”, o famosésimo poema de Rudyard Kipling, ao transformar um conselho ou “receita” moral, uma previsão do que poderá acontecer, em uma espécie de lamentação pelo que já ocorreu. Falta do que fazer? Claro, por que não?
 
Se tivesses sido capaz de manter a tua calma quando todo o mundo ao teu redor já a tinha perdido e te culpava; de crer em ti quando todos duvidavam, e para esses no entanto achar uma desculpa; se tivesses sido capaz de esperar sem te desesperares, ou, enganado, não mentir ao mentiroso, ou, sendo odiado, sempre ao ódio tivesses te esquivado, e ainda assim não parecer bom demais, nem pretensioso; se tivesses sido capaz de pensar –sem que a isso só te atirasses, de sonhar – sem fazer dos sonhos teus senhores; se encontrando a desgraça e o triunfo tivesses conseguido tratar da mesma forma a esses dois impostores; se tivesses sido capaz de sofrer a dor de ver mudadas em armadilhas as verdades que disseste, e as coisas, por que deste a vida, estraçalhadas, e refazê-las com o bem pouco que te restasse; se tivesses sido capaz de arriscar numa única parada tudo quanto ganhaste em toda a tua vida, e perder e, ao perder, sem nunca ter dito nada, resignado, tornar ao ponto de partida; de forçar coração, nervos, músculos, tudo a dar seja o que fosse que neles ainda existisse, e a persistir assim quando, exaustos, contudo restasse a vontade em ti que ainda ordenasse: "persiste!"
Se tivesses sido capaz de, entre a plebe, não te corromper e, entre reis, não perder a naturalidade, e de amigos, quer bons, quer maus, tivesses te defendido; se a todos tivesses podido ser de alguma utilidade, e se tivesses sido capaz de dar, segundo por segundo, ao minuto fatal todo o valor e brilho, tua teria sido a Terra e tudo o que nela existe, mas de realidades alternativas o inexistente inferno está cheio, pois “se” no passado, presente ou futuro só exprime o que poderia, pode ou poderá acontecer. E isso nunca levou, leva ou levará ninguém a lugar nenhum.

terça-feira, 14 de janeiro de 2025

RENOVANDO O SEGURO

 
Hoje me ocorreu que a Inteligência Artificial pode dominar o mundo de um jeito inesperado, simples, apenas estressando as pessoas ao ponto de enlouquecê-las. Parece bizarro, algo saído do final de 1984, mas depois de tentar renovar o seguro do meu carro, já acho viável. E a chave é a quase total impossibilidade de conversar ponderada e calmamente com pessoas de carne e osso. Tudo começou quando recebi no final de 2024 esta mensagem “sedutora” pelo WhatsApp:
 
Olá, JOSE BOTELHO! Aproveite agora mesmo uma oferta especial para renovar o seu BB Seguro Auto com um desconto imperdível.
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Logo abaixo havia três “botões”, com estas opções: “Quero meu desconto”, “Me ligue” e “Deixar passar”. Escolhi o primeiro. Em segundos, recebi a promessa de que “um especialista” cuidaria do meu caso. E começou o show.
 
Por não andar com o celular pendurado no pescoço nem enfiado na cueca e por ser um aposentado muito ocupado, um verdadeiro homem “dólar” (do lar), já estava cuidando das minhas obrigações diárias de escravo quando chegaram estas mensagens estilo “centauro” (metade máquina, metade gente):
 
15:28: Boa tarde! Meu nome é Rafael da BB seguros, estou entrando em contato para apresentar os valores da renovação do seguro do seu veiculo, podemos falar?
15:35: Preciso que interaja comigo para o atendimento não ser encerrado automaticamente. Está aí?
15:39: Por falta de interação o atendimento foi encerrado. Para voltarmos a nos falar será necessário que realize novo preenchimento neste canal, ou então faça contato no telefone 0800 729 0400.
15:40: Seu atendimento por aqui foi encerrado. Se precisar de mais informações pode entrar em contato conosco pelo Whatsapp  (11) 4004 7000. Até breve!
 
Fiquei puto ao descobrir que um algoritmo cretino me obrigava a ficar plantado em frente ao computador (eu não uso o celular), de castigo, para evitar o "encerramento automático" do contato. Liguei para o 0800 e, finalmente, consegui falar com alguém do mundo real, alguém de carne e osso. Falei de minha trágica situação financeira, em parte provocada pelos gastos com a doença de minha mulher. Creio que a moça com quem conversava ficou muito impressionada com meu relato, tanto que sugeriu deixar para renovar o seguro para mais perto de seu vencimento, pois poderia estudar a melhor proposta para mim. E o otário aqui ficou esperando, esperando...
 
Foi quando surgiu nova mensagem (automática, obviamente):
13:48: Precisamos retomar a negociação para renovar seu seguro Auto da BB Seguros. Não deixe seu veículo sem proteção!
Olá, JOSE BOTELHO, sou o assistente virtual da BB Seguros! Espero que esteja bem!
O seguro do seu veículo está a 4 dias do vencimento, e percebemos que ainda não foi renovado. Siga rodando protegido com seu veículo.
Fale com um dos nossos especialistas e garanta a renovação do seu seguro.
 
Logo abaixo apareciam novamente três “botões” com as seguintes opções: “Falar por aqui”, “Quero ligar” e “Receber ligação”. A opção escolhida foi “Receber ligação” – que nunca aconteceu. Mas segue o baile.
 
15:56: Receber ligação
15:56: Olá , este atendimento está registrado sob o nº 2020000340005814816.
16:16: Olá, espero que esteja bem! Me chamo Érica, faço parte da BB Seguros e darei andamento no seu atendimento. Agradeço o contato e interesse em proteger seu veículo conosco.
16:23: Foi para você que eu contei a situação dramática em que vivo e você então disse que estudaria a melhor proposta para mim?
16:30: esse é meu primeiro contato com voce
16:39: Poderia me ligar para conversarmos um pouco? Prometo ser rápido e objetivo.
 
Como eu tinha escolhido a opção “Receber ligação”, desencanei e fui cuidar da vida. Ao voltar para a frente do computador lá estava a mensagem repeteco:
:
17:24: Por falta de interação o atendimento foi encerrado. Para voltarmos a nos falar será necessário que realize novo preenchimento neste canal, ou então faça contato no telefone 0800 729 0400.
17:24: Seu atendimento por aqui foi encerrado. Se precisar de mais informações pode entrar em contato conosco pelo Whatsapp  (11) 4004 7000. Até breve!
 
Aí eu realmente fiquei putíssimo e liguei para o 0800. Despejei sobre a coitada que me atendeu toda a minha ira e exasperação pelo fato de ser obrigado a ficar de olho na telinha (para mim ilegível) do celular ou com a bunda colada na cadeira do micro, uma situação de enlouquecer até um psicólogo da linha freudiana. E terminei sugerindo: “mate esse algoritmo, essa inteligência artificial que exige que estejamos à sua disposição e não o contrário disso”.
 
Copiando uma frase lida em algum lugar, “Alguém pode me passar o número do suporte técnico para a paciência humana? Acho que estou com o estoque zerado”. E até agora não renovei meu seguro.

domingo, 12 de janeiro de 2025

CAMINHOS DO TEMPO – JOSÉ LUIZ RICCHETTI


Houve um tempo, quando ainda éramos muito jovens e com pouco tempo de casados, que minha mulher e eu viajávamos com sua irmã e seu então marido para Três Marias, onde ficávamos hospedados em uma casa agradabilíssima e com quintal enorme (10.000 m²). Era um lugar super tranquilo e isolado, ao lado de um bosque de pinheiros e distante da área urbana. Ficávamos lá jogando conversa fora, ouvindo música (ele fã dos Rolling Stones e eu fã dos Beatles), às vezes pescando na beira do Rio São Francisco, outras vezes fazendo churrasco e queimando madeira enquanto conversávamos até tarde da noite.
 
Um dia esse casal se separou e passamos a nos encontrar com esse ex-cunhado/concunhado em raríssimas vezes, mas sempre com o mesmo sentimento de amizade cultivado na época do convívio quase diário.  Hoje, inesperadamente, recebi desse amigo e ex-concunhado um texto muito legal que, segundo ele, fez com que se lembrasse de mim. E é este texto que compartilho agora com os leitores do Blogson.


Há um silêncio que chega com os anos, e ele não é feito apenas da ausência de ruídos, mas da transição suave entre o que éramos e o que nos tornamos. Aos 60, você começa a sentir a sutileza do distanciamento. A sala que antes pulsava com suas ideias agora parece cheia de vozes que não pedem mais sua opinião. Não é uma rejeição, é o ritmo da vida. É quando aprendemos que nossa contribuição não está no presente imediato, mas nos rastros que deixamos nos corações e mentes ao longo do caminho.
 
Aos 65, você percebe que o mundo corporativo, outrora tão vital, é um fluxo incessante. Ele segue, indiferente ao que você fez ou deixou de fazer. Não é uma derrota, é a libertação. Esse é o momento de olhar para si mesmo, despir-se do ego e vestir a serenidade. Não se trata mais de provar, mas de ensinar, de compartilhar, de ser mentor. A verdadeira realização não é a que se exibe, mas a que inspira.
 
Aos 70, a sociedade parece lhe esquecer, mas será mesmo? Talvez seja apenas um convite para reavaliar o que realmente importa. Os jovens não o reconhecerão pelo que você foi, e isso é uma bênção disfarçada: você pode agora ser apenas quem você é. Sem máscaras, sem títulos, apenas a essência. Os velhos amigos, aqueles que não perguntam “quem você era”, mas “como você está”, tornam-se joias preciosas, diamantes que brilham no crepúsculo da vida.
 
E então, aos 80 ou 90, é a família que, na sua correria, se afasta um pouco mais. Mas é aí que a sabedoria nos abraça com força. Entendemos que amor não é posse; é liberdade. Seus filhos, seus netos, seguem suas vidas, como você seguiu a sua. A distância física não diminui o afeto, mas ensina que o amor verdadeiro é generoso, não exigente.
 
Quando a Terra finalmente chamar por você, não há motivo para medo. É a última dança de um ciclo natural, o encerramento de um capítulo escrito com suor, lágrimas, risos e memórias. Mas o que fica, o que realmente nunca será eliminado, são as marcas que deixamos nas almas que tocamos. Portanto, enquanto há fôlego, energia, enquanto o coração bate firme, viva intensamente. Abrace os encontros, ria alto, desfrute os prazeres simples e complexos da vida. Cultive suas amizades como quem cuida de um jardim. Porque, no final, o que resta não são as conquistas, nem os títulos, nem os aplausos. O que resta são os laços, os momentos partilhados, a luz que espalhamos. Seja luz, seja presença, e você será eterno.
 
Dedico a todos que entendem que o tempo não apaga, mas apenas transforma.
(11/12/24)
 

POESIA INFANTIL

Há tempos deixei de me aventurar a musicar meus poemas sem rima com o auxílio da incontrolável IA Suno. E o motivo é simples: essa inteligên...