domingo, 23 de novembro de 2025

O MEDO DOS IGNORANTES

 
Este texto foi escrito no final de agosto de 2025, e eu o fui empurrando para depois, por estar publicando textos mais interessantes. Isso mostra que algumas postagens têm data de validade e que, se não forem postadas no momento certo, acabam ficando meio rançosas.

Hoje, para mim, a extrema direita é, entre outros defeitos, a expressão mais radical do obscurantismo e da negação da ciência. Como imaginar que o secretário de Saúde dos Estados Unidos, Robert F. Kennedy Jr., justamente quem deveria incentivar as melhores práticas de saúde, revele tanto negacionismo e preconceito contra as vacinas? Segundo o site The Conversation, “Kennedy lançou um ataque generalizado à infraestrutura de vacinas dos EUA: destruiu comitês de supervisão, semeou dúvidas sobre ciência estabelecida, politizou a segurança dos ingredientes, limitou o acesso a vacinas e suspendeu o financiamento para pesquisas”.
 
Eu simplesmente enlouqueço quando leio notícias assim. Na prática, é como deixar uma raposa tomando conta do galinheiro. Em plena pandemia da Covid, antes mesmo da Coronavac, eu dizia que tomaria qualquer vacina que me protegesse da sanha da mamoninha assassina. Podia ser feita até de cocô de pombo, que eu tomaria, porque nunca duvidei de vacina alguma. Quando idiotas questionaram a rapidez da criação da vacina de RNA mensageiro, agiram como os cariocas que, no início do século XX, se opuseram à vacinação contra a febre amarela. Em outras palavras: preconceito, ignorância e estupidez.
 
Foi depois de ler um extenso artigo da BBC, intitulado “A história do movimento antivacina no mundo, que repete os mesmos argumentos há séculos”, que resolvi condensar e reduzir à metade as cinco páginas do texto original. Lê aí:
 
A humanidade sempre enfrentou epidemias letais, como a varíola, responsável por milhões de mortes até ser erradicada em 1980 com a vacina criada por Edward Jenner em 1796. Estima-se que, nos últimos 50 anos, vacinas tenham salvado mais de 150 milhões de vidas.
Mas a resistência surgiu junto com a prática. Antes mesmo das vacinas, a variolação — introduzida no século 18 — já era atacada por religiosos como o reverendo Edmund Massey, que a considerava uma afronta à vontade divina, uma “operação diabólica”. Com Jenner, proliferaram sociedades antivacinação, panfletos e sermões que denunciavam a imunização como antinatural, venenosa ou conspiratória. Uma ilustração de 1802, por exemplo, mostrava vacinados se transformando em vacas, ecoando temores que hoje se traduzem em boatos sobre DNA.
No século 19, movimentos antivacina organizaram protestos na Inglaterra, no Canadá, nos EUA e no Brasil, onde a Revolta da Vacina (1904) paralisou o Rio de Janeiro. Muitos argumentos se baseavam na defesa da liberdade individual, rejeitando a vacinação obrigatória imposta por governos. Mesmo diante de surtos que atingiam sobretudo crianças, ativistas sustentavam que higiene e quarentena seriam suficientes.
A oposição nunca desapareceu. Com a internet e as redes sociais, antigas falácias se multiplicaram. Entre 2018 e 2023, a confiança dos britânicos nas vacinas caiu de 90% para 70%. A OMS classifica a hesitação vacinal como uma das dez maiores ameaças à saúde pública. O sarampo, considerado eliminado nos EUA em 2000, voltou a registrar surtos fatais por causa da queda da cobertura vacinal.
Os discursos antivacina, embora atualizados com linguagem moderna, continuam recorrendo a velhos padrões: medo, teorias conspiratórias, defesa de liberdades absolutas e visões religiosas que interpretam doenças como castigos divinos. Dois séculos depois, são as mesmas falácias que ameaçam conquistas fundamentais da ciência.

agosto 2025

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