O batizado da neta de uma cunhada aconteceu
no mesmo dia do meu aniversário. Não estava com vontade de ir, mas minha mulher
– apesar de sua limitação atual por estar usando andador – fez questão de
comparecer. Isso me fez vivenciar sensações que não imaginava vir um dia a sentir.
Mesmo sendo irrelevantes, resolvi descrever
as emoções que senti ao entrar naquela igreja que frequentei por tantos anos.
Logo de início, estranhei o comportamento severo do celebrante, um diácono
permanente com uma postura mais intransigente que, talvez, a do próprio vigário
da paróquia. E foi aí que percebi estar me sentindo um invasor, um estranho
naquele ninho que tantas vezes me acolheu e ajudou a acalmar minhas angústias.
Sinceramente, senti saudade do tempo em que ia à missa todos os domingos, do
tempo em que participava alegremente do grupo de apoio ao movimento de jovens
da paróquia. Mas, naquele momento, já não estava mais ali o católico que sempre
comungava com fervor e devoção, pedindo a Deus que aumentasse sua fé (e ela
sempre diminuía).
Naquele instante, só existia um diácono chato
falando abobrinhas que eu nem escutava, e que ainda me lançava olhares de
reprovação. Foi então que percebi o anacronismo do catolicismo, tão engessado e
burocrático quanto uma empresa pública deficitária e obsoleta.
Mas confesso que me diverti mais com a presença
na igreja de duas jovens religiosas, com visões tão antagônicas que não pude
deixar de rir. Ajudando na celebração do batismo, estava uma irmã vestida de
forma espartana, vinda da Toca de Assis – uma fraternidade inspirada na vida de
São Francisco de Assis, que busca viver em pobreza radical e voltada ao amor
aos pobres, especialmente os que vivem nas ruas.
Do lado oposto, uma das tias da criança
batizada, pertencente aos Arautos do Evangelho – uma associação ultra
conservadora surgida da famigerada TFP (Sociedade
Brasileira de Defesa da Tradição, Família e Propriedade), com sua
indumentária que lembrava a de um cruzado, um cavaleiro medieval: botas de cano
alto, túnica bege ornada com a cruz de Santiago, um rosário na cintura e uma
corrente de ferro simbolizando a ligação com Maria. Ao vê-la assim paramentada,
meu filho comentou sua semelhança com um cavaleiro Jedi.
Resumindo, as duas religiosas eram como que símbolos
vivos dos conflitos internos da Igreja Católica – uma quase franciscana, outra
quase templária. E o diácono enchendo o saco com sua interminável preleção.
No final da cerimônia, triste por perceber
que já não me encaixo mais nesse mundo, tive vontade de reproduzir as palavras
de Jesus pregado na cruz:
- Senhor, por que me abandonastes?
Sabe, de vez em quando eu sinto saudades de quando eu era um diácono, futuro e promissor pastor protestante. Não sei se a palavra é bem "saudade" mas o tempo vivido no meio religioso queiramos ou não nos deixam marcas. Umas boas e outras ruins. O catolicismo é tão fragmentado quanto os evangélicos, a diferença é que as muitas ordens que surgem dentro da igreja não saem dela para fundar uma igreja concorrente, ficam todas ali, nos braços da igreja mãe - única verdadeira e a única que pode levar ao céu.
ResponderExcluirEu sempre digo que só sinto saudade de mim. Neste caso, sinto saudade de um Jotabê religioso, praticante, crente.
Excluir- Senhor, por que me abandonastes?
ResponderExcluirTalvez você apenas tenha se dado conta de que Ele nunca esteve de fato com você. Nem com ninguém.
Ele podia não estar comigo, mas eu estava sempre com Ele.
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