sexta-feira, 7 de junho de 2019

UM CONSELHO DE BUKOWSKI

Este é um post tão especial que imaginei mais de um título para ele (e, até mesmo, não colocar nenhum): "Agora, chega!", "A ficha caiu", "Cansei", "De saco cheio", "Rua sem saída", "Fim da linha", "Carta de despedida" (acabei de dar um spoiler) e, finalmente, "Um conselho de Bukowski".

Ora - direis - por que "um conselho de Bukowski”? Certo perdeste o senso! E eu vos direi, no entanto, que é um dos melhores conselhos que se poderia dar a alguém. Mesmo não apreciando seus poemas pelo excesso de obscenidade e vulgaridade neles contidos (sou caretão, entende?), não há como não seguir essas suas palavras:

“Não sejas como muitos escritores, não sejas como milhares de pessoas que se consideram escritores, não sejas chato nem aborrecido e pedante, não te consumas com auto-devoção. As bibliotecas de todo o mundo têm bocejado até adormecer com os da tua espécie. Não sejas mais um. Não o faças”.

Além dos títulos, fiz também várias tentativas (algumas, bastante patéticas e ridículas) para escrevê-lo, cada uma com estados de espírito e intenções diferentes (até mesmo antagônicas). Por isso, resolvi juntar todos os rascunhos, esboços e anotações iniciais que fiz, para concluir este post (alguns estão restritos a uma única linha apenas). Bora lá:

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Que eu posso dizer sem ficar muito piegas? Tenho 68 anos, sou um homem idoso que finge ou brinca de ter mente jovem, de ser espirituoso, antenado, culto e original. Talvez por isso, consegui empanturrar o blog com mais de 1500 posts, verdadeiros monumentos da presunção e mediocridade. Se, dentre esse universo eu conseguir tirar cinco ou quatro, talvez três ou dois ou até mesmo apenas um que realmente tenha algum valor, terá valido a pena manter o blog “positivo e operante” até hoje. Segundo o Drummond, “As obras-primas devem ter sido geradas por acaso; a produção voluntária não vai além da mediocridade”.

Mas não é isso que realmente importa. O que faz a diferença é que não tenho mais nada para dizer de minimamente interessante, divertido, criativo ou comovente. Nem paciência para ficar tentando! A sensação presente é a de ser um burocrata que - mesmo esquecido em um canto da sala que fica depois do arquivo morto - se arrasta ao fim do dia para marcar seu cartão de ponto. E, convenhamos, é bizarro um cara de 68 anos manter um blog só para fazer gracinhas para um público inexistente. Mas deixo claro que fico feliz e surpreso com a quantidade de visualizações alcançadas até hoje, ainda que anabolizada pelos acessos (e excessos) esporádicos dos robôs do Google.

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Acho que vou deixar este post sem título nenhum.

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Não sei como escrever uma carta de despedida. Se eu morrer até os setenta anos, será um alívio, pois não quero que meus filhos e netas sintam vergonha de mim, da minha infantilidade, da minha inadequação emocional.

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Quando tinha apenas vinte anos, o Vinicius de Moraes escreveu o belíssimo poema "Velhice", onde faz uma projeção do que poderia vir a ser. A seguir, um extrato do original.

Virá o dia em que eu hei de ser um velho experiente
Olhando as coisas através de uma filosofia sensata
E lendo os clássicos com a afeição que a minha mocidade não permite.
Nesse dia Deus talvez tenha entrado definitivamente em meu espírito
Ou talvez tenha saído definitivamente dele.
(...)Serei um velho, não terei mocidade, nem sexo, nem vida
Só terei uma experiência extraordinária.
Fecharei minha alma a todos e a tudo
Passará por mim muito longe o ruído da vida e do mundo
Só o ruído do coração doente me avisará de uns restos de vida em mim.
(...) Serei um corpo sem mocidade, inútil, vazio
Cheio de irritação para com a vida
Cheio de irritação para comigo mesmo.
O eterno velho que nada é, nada vale, nada teve
O velho cujo único valor é ser o cadáver de uma mocidade criadora.

Lindo, não? Até onde imagino, ele ficou bem distante dessa "receita". Para mim, entretanto, ela é perfeita. Em outras palavras, "esse cara sou eu". E isso tem-me incomodado. Hoje, assumida a velhice de forma definitiva, vejo uma grande inadequação no fato de um idoso de 68 anos ter um blog onde age e escreve como se fosse adolescente.

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O que acaba primeiro - os sonhos, um blog ou a vida? Para mim, no meu caso, a ordem é exatamente esta: primeiro vão-se os sonhos; a partir daí, o blog é abandonado. E a vida, até quando Deus quiser. Estava pensando sobre isso, sobre dois blogs que acompanhava. Um, simplesmente desapareceu; o outro emudeceu (deve ter erro de gramática nesta frase, mas fica assim mesmo).

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Tenho tido tão pouca inspiração que nem consigo escrever uma carta de despedida decente. Aliás, estou sem saco nenhum para ficar pensando em "velhidades". Por isso, a partir de agora, aproveito um texto que surgiu há mais tempo. Antes, porém, um verso escrito pelo poeta Torquato Neto:

Adeus, vou pra não voltar e onde quer que eu vá, sei que vou sozinho

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Este texto foi escrito já faz algum tempo. Por ser um texto depressivo (como a maioria dos recentemente postados), ficou hibernando um pouco. Não o escreveria hoje, pois meu punho está doendo e estou sem muita paciência para ficar choramingando (como na maioria dos recentemente postados). Mesmo assim, chancelo - com algumas reservas - tudo o que foi escrito antes.

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Este é um post sem título. Também não está indexado a nenhuma das "seções" do blog. A razão para esta escolha encontra-se no final do texto. O que importa agora é saber que ao longo do tempo em que os mais de 1500 posts foram sendo publicados, uma imagem de mim mesmo, fragmentada, mas cada vez mais incômoda, foi se formando. Cada post acrescentava um fragmento ao mosaico que surgia. Pouco importa se os temas eram lançados nessa ou naquela "seção", se contavam casos da infância ou piadas imbecis, pois cada novo pedaço traía a origem única, encharcada de desesperança, solidão, ironia ou desespero, raiva, medo ou depressão. Qualquer que fosse o sentimento predominante, o GPS apontava sempre as mesmas coordenadas.

O que sei é que esse mosaico foi revelando uma personalidade só levemente percebida por mim (e até mesmo negada): uma pessoa egocêntrica, vaidosa, invejosa, neurótica, um pouco sádica, presunçosa, mesquinha, insegura, pedante, rancorosa, falsa (muito falsa), desprovida de compaixão, fútil, imatura e medrosa (muito medrosa). E, principalmente, ridícula e infantil.

Não é nada agradável descobrir isso de alguém, ainda mais se esse alguém é você mesmo. Talvez eu tenha passado toda a minha vida tentando não ser assim ou escondendo esse lado degradado. Talvez seja esse o motivo de ter citado tantas vezes o retrato de Dorian Gray (mesmo sem nunca ter lido o livro), o personagem Mr. Hyde (d'O médico e o monstro) e de achar que o Poema em Linha Reta traça meu perfil de modo fiel.

Minha vida hoje está uma merda, tenho sentido medo de tudo, um medo tão abrangente que faz com que eu tenha vontade de estar morto, mesmo que não pense em me matar (pelo menos, não ainda). Não sinto graça mais em nada, tenho uma melancolia permanente, não tenho vontade de fazer nada e tenho medo de que os fragmentos que faltam para completar meu mosaico apenas tornem mais agudo esse sentimento. Perdi a inspiração até para falar idiotices. Por isso, tomei a decisão de dar um tempo no velho Blogson. Hoje, sinceramente, espero que esse tempo seja infinito.

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Tenho sessenta e oito anos, descobri que tenho esteatose hepática (gordura visceral que pode levar à cirrose hepática ou a um transplante) e “ateromatose carotideana e em artéria vertebral esquerda” (sabe lá Deus o que isso significa). Então, não posso ficar com cara de paisagem, acreditando que tenho "todo o tempo do mundo". Não tenho. Além disso, está faltando tesão, nada mais me interessa. Este blog foi diversão e frustração, espelho ou holofote, um palanque para meus desabafos, um touro metálico aquecido onde eu entrava para urrar minha dor existencial. Depois de hoje, não quero mais fazer isso, pois ficam cada vez mais risíveis esses desabafos. Por esse motivo e diante de tudo o que falei, resolvi dar um tempo no blog.

Mais uma vez, agradeço a cada um dos leitores que fizeram algum tipo de comentário (especialmente à “J” – que sumiu e ao “Marreta” - que resistiu até hoje). Agradeço também aos que nunca fizeram nenhum comentário, pois todos contribuíram para muitos momentos felizes que vivi. Também lamento que o "Ozymandias Realista" tenha começado a seguir o blog só agora, em seu ocaso.

Como não pretendo remover o Blogson, que ele fique “à deriva”, flutuando sem rumo e sem combustível no oceano poluído da internet. Podem fazer o que quiserem (ou não) com os posts. Os comentários que porventura surgirem serão publicados em algum momento, mas não necessariamente respondidos.

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Esta é uma “carta de despedida” endereçada a todos que acessaram o Blogson Crusoe desde sua criação. Agradeço a todos que comentaram algum post e também aos que nunca comentaram nada, pois o simples fato de acessar o blog sempre foi motivo de muita alegria para mim. Agradeço especialmente ao titular do “A Marreta do Azarão” e à titular do desaparecido “Elemento Jota”, responsáveis pela quase totalidade dos comentários feitos.

Mas, por que uma carta de despedida? Porque o blog transformou-se em uma droga viciante – ou fui eu que me tornei um drogadicto do blog (um blogadicto, talvez). E quando eu comparo o blog a uma droga eu me refiro à sua semelhança com as drogas que causam dependência no usuário. O início é sempre bom, agradável e divertido. Com o passar do tempo, pode acontecer desse usuário resolver abandonar o vício, mas aí é que o bicho pega. E é isso que tem acontecido com o blog: longe me fazer bem, tem-me feito muito mal.

Obviamente a razão disso é o esgotamento da criatividade e do que fazer. Cada novo post tem saído pior que o anterior, mais espaçado, de parto mais difícil. Por isso, eu preciso voltar para o mundo real (mesmo que esse mundo seja um porre). E o problema é que não sei como desligar essa merda, essa obsessão doentia. Assim, só vejo uma solução: dar um tempo, paralisar a ânsia de postar coisas "novas" sobre meu umbigo que não interessam a ninguém. Se der vontade de voltar, volto. Se não der, não deu.

A título de encerramento, transcrevo uma frase grafitada que encontrei recentemente: Eu finjo que sou artista e a sociedade que é crítica de arte”. A partir de agora não finjo mais. See you later alligator! (preciso urgente inventar alguma coisa para fazer)





NOTAS "POST MORTEM":
Depois da morte do velho Blogson, fiquei agitado, inquieto, sem saber o que fazer. Talvez pela força do hábito, às vezes tinha vontade de escrever alguma coisa, mas não tinha mais um lugar para isso. Tentei investir no Facebook, mas a cada tentativa de fazer humor ou a cada imagem provocativa que postava, em vez de reações de riso, recebia comentários seríssimos, contestando ou aprovando o que eu havia dito só por diversão.

Por isso, depois da “missa de sétimo dia” do Blogson, decidi que precisava criar novo blog, pois ressuscitar o blog pela segunda vez demonstraria uma imensa falta de caráter (que, aliás, não tenho mesmo) e serviria de motivo para piadas.


Resolvi então criar o “Lingüiça no Fumeiro”, um blog ao estilo do Blogson, mas sem a preocupação das postagens frequentes e sem o “auxílio luxuoso” de outros autores. Em outras palavras, o Lingüiça será (é) um blog cem por cento autoral, mesmo que essa porcentagem não se reflita na qualidade dos posts. Significa apenas que os textos, desenhos e melodias de outros autores que enriqueciam o Blogson não serão encontrados no novo blog. Ou seja, Lingüiça será uma espécie de primo ou irmão mais pobre do falecido.







14 comentários:

  1. Não posso dizer que não tenha me surpreendido você se render assim ao velho Buk. Você sabe que o cara foi foda, né?
    E já que está aprendendo a apreciar o velho safado, vão mais umas frases dele sobre o ato de escrever:
    "E cada vez que escrevo um poema, é mais uma muleta que me faz seguir em frente."
    "Sou egoísta, gostaria de continuar a escrever palavras. Isso me dá um brilho, me joga no ar dourado."
    "Essas palavras que escrevo me protegem da completa loucura."
    "Um bom poema pode fazer uma mente despedaçada voar."

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    1. As duas últimas são as melhores. A propósito, lamento ter atendido seu pedido e excluído o primeiro comentário que fez sobre este post, mas sempre agradecerei a oportunidade de tê-lo lido.

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  2. Ahh JB, tá vendo assim você até me tira do túmulo. Odeio quando voce fala de mim como no feminino, sabia? Quando criei o hoje extinto e por vezes saudoso cafofo que chamei de O Elemento Jota me esforcei bastante pra plantar a dúvida sobre ser uma entidade masculina ou sei lá, uma alma feminina presa num corpo alto másculo kkkkk
    Brincadeiras à parte, sabes que é um prazer ter notícias suas, um noticiário "jotabelístico" se assim posso me apropriar. Espero de verdade que você se estenda quantas vezes mais.
    Um bjo da sua amiga ou amigo,
    "J" ;)

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    1. "Um dia, vivi a ilusão de que ser homem bastaria, que o mundo masculino tudo me daria, o que eu quisesse ser. Que nada, minha porção mulher que até então se resguardara é a melhor porção que trago em mim agora..." Assim disse o Gilberto Gil. Talvez ele estivesse psicografando o "Elemento Jota", a sua essência, a sua alma. Pouco importa. O que sei é que gostei demais de você ter "aparecido". Hoje, temos em comum o fato de ter criado e acabado com dois blogs meio sem noção. Mudando de assunto: já te ocorreu que a letra J maiúscula na fonte Comic Sans MS poderia lembrar um homem de braços abertos e de pau duro? Dessa forma, o "Elemento Jota" teria (ou seria) um jota másculo em estado de de ereção! Mais masculino que isso, impossível (acho que preciso reduzir minha cota diária de leite com Toddy).

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    2. Porra JB, esse cara aí seria canhoto hahaha Eu sou destra, aqui -apesar de eu ser cercada por canhotos- o lado esquerdo só pega no pesado, a sintonia fina cambou tudo pra o lado direito ou descambou, sei lá. Uma particularidade que eu percebi que O Jota, assim como todas as letras, é masculino, a diferença é que ele tem aquela manha feminina. Vai ver é o som, né rsrsr. E eu adorei o trecho do Gil.

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  3. É "A" Jota. Tenho a certeza de que não há nada de pau duro ali.

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    1. Não entendi, mas tudo bem. E seus poemas, continua a fazê-los?

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    2. Meu caro Marreta, a pergunta foi dirigida "ao" Jota, pois você continua fazendo (e faz muito bem). Não tenho comentado nada por estar vivendo uma fase mais depressiva (só falta você falar que "isso é coisa de viado!").
      Mudando de assunto: com sua caretice permanente, o facebook está "pequeno" para mim, mesmo que eu sempre tente incomodar as pessoas (a última foi esta "pérola": Moro teria dito: "In Fux we trust". Já as meninas desinibidas da Rua Guaicurus talvez dissessem “In fucks we trust”). Por isso, com o Blogson morto, estou pensando em criar novo blog só para passar o tempo. Que acha?

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    3. Rapaz, o poema que me enviou, Ampulheta, só vem provar que você ainda tem muito a dizer.
      Você, há uma semana, deixou o Blogson, mas o Blogson não deixou você. Prova disso é que ainda estamos nos falando por aqui. Prova disso é que você não abandonou o seu próprio velório. Ainda vem velar o defunto. Recusa-te a fechar a tampão do caixão.
      Criar um novo blog? Para quê? A ideia não era se livrar da ansiedade que um blog nos causa? Se for para criar um novo, volte com o Blogson e pronto.
      Ressuscite o Blogson publicando o Ampulheta.
      Aliás, se você não publicar, eu vou acabar publicando. Não revelarei, a seu pedido, a identidade do autor, direi que recebi de um anônimo.
      "por que não estreitas ainda mais a tua cintura", gostei pra caralho.
      Grande abraço, Jotabê.
      Vou continuar passando por aqui.

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    4. Meu caro Marreta, não se trata de ter ou não o que dizer. Como disse no corpo do post, "Hoje, assumida a velhice de forma definitiva, vejo uma grande inadequação no fato de um idoso de 68 anos ter um blog onde age e escreve como se fosse adolescente". E um homem precisa ter caráter. Se fala que vai parar, PRECISA parar ou vira motivo de piada. Por isso a ideia de criar um novo blog, pois às vezes preciso desabafar (e o Facebook é uma igreja evangélica). O Blogson e o novo blog seriam como aquelas salsichas ou linguiças emendadas: a carne é a mesma, a fabricação é a mesma, a merda é a mesa. O que muda é o fato de serem independentes uma da outra.

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    5. Então, ficarei no aguardo do novo blog.
      Avise quando.

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    6. Se eu continuo a escrever? Estou escrevendo agora rsrsrs "meu pau vestigial continua em riste, viu, Azarão". Mas pra ser bem franca, o meu processo criativo é meio insolente. Como agora, acabei de cruzar uma praça e antes de chegar do lado oposto já tinha pisado em merda de cachorro e pelo menos dois poemas. Todo dia tem algo que me incomoda o suficiente pra chamar de poesia.
      "J"

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    7. adoro os paus vestigiais, conhecidos também como grelos.

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