Eu nunca quis participar de reuniões anuais de
ex-colegas. Logo depois de formado, fui convidado para umas duas ou três, mas
depois de várias recusas, desistiram de me chamar. Para mim, tudo bem, pois
sempre achei esses encontros um porre. Porque só vai quem está bem na fita,
quem acabou de ganhar isso e aquilo. Ex-colega fodido não vai. Para quê? Para
exibir suas dificuldades, seus fracassos, sua falta de grana ou desemprego? Não
mesmo! Além do mais, nunca consegui criar vínculos sólidos de amizade com os
colegas, pois, graças às muitas dependências que peguei, estava sempre em uma
sala diferente, única forma de conciliar as matérias do semestre com as
dependências que precisava concluir (acho que dá para imaginar o tipo de aluno
que fui, concordam?).
Outro assunto que deve surgir nesses encontros são as lembranças de sacanagens com esse ou aquele professor (ou colega). Por mais paradoxal que seja - pois gosto de contar casos antigos - acho isso extremamente tedioso, coisa de gente saudosista. Afinal, uma coisa é registrar fatos e casos pitorescos do passado, outra é ficar salivando de saudade dos tempos idos. Por isso, o máximo que consigo é tentar imaginar os papos que rolam. Foi esse o motivo de tentar reproduzir o "lado negro" de uma dessas reuniões, quando alguém propõe que se contem casos de fracassos, medos, insucessos e fragilidades. Sinceramente, duvido que isso possa acontecer em um encontro de "doutores". Mesmo assim...
A reunião anual da turma de ex-colegas
transcorria normalmente, com seu desfile previsível de egos anabolizados,
relatos de viagens internacionais, carrões e sucesso profissional. Todos
exibiam um pedantismo inexistente nos tempos de faculdade. Como tinham se
formado há muito tempo, o numero de presentes diminuía a cada ano. Em certo
momento, um deles fez uma proposta para tornar a reunião mais divertida.
- Que
tal se cada um contasse uma história profissional que gostaria de ver
reescrita, de nunca ter acontecido?
Olhar-se no espelho e admitir as próprias
falhas e fracassos perante aquele grupo tão esnobe causou algum desconforto na
maioria, com alguém logo reclamando:
- Eu não tenho nenhuma história desse tipo para contar. E se tivesse não contaria!
- Deixa
de ser viado, conta logos os podres do passado!
- Já
disse que não tenho! E já que esta reunião vai ficar esse "vale de
lágrimas", vou aproveitar e me mandar mais cedo, pois tenho hoje um
compromisso inadiável.
Abraços, cumprimentos e juras de "ano que vem estaremos aqui novamente" liberaram a saída do fujão, discretamente acompanhado por mais dois. E o silêncio instalou-se no meio do grupo.
- Quem
começa?
- Já
que a sugestão foi sua, pode começar.
- Conta
aí, Fred!
- Bom,
vocês sabem que eu fui o pior aluno da nossa turma, não é?
- O
pior eu não sei, mas o mais escrotão, sim!
-
Então... Eu tinha pouco tempo de formado quando me mandaram para uma obra no
interior. A sorte é que por ser um contrato grande, havia mais
engenheiros. Assim, se o bicho pegasse pro meu lado, eu tinha a quem recorrer.
Um dia, um dos encarregados me procurou para saber o que fazer em determinado
assunto da obra. Escutei o que ele me disse, não entendi porra nenhuma, mas dei
nele o maior esporro: -"Se você, puta velha de construção que é, ainda não
sabe como fazer, não sou eu que vou te ensinar"! Virei as costas e saí
rapidamente dali. Me dei bem, não?
- O
coitado do encarregado deve ter xingado umas dez gerações de sua família!
- Ah,
ah, ah! Depois disso, ele passava longe de mim.
-
Grande filho da puta, isso sim! Quem é o próximo agora?.
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