Yuval Noah Harari escreveu em seu livro Sapiens que “Nossa linguagem singular evoluiu como um
meio de partilhar informações sobre o mundo. Mas as informações mais
importantes que precisavam ser comunicadas eram sobre humanos, e não sobre
leões ou bisões. Nossa linguagem evoluiu como uma forma de fofoca. De acordo
com essa teoria, o Homo sapiens é antes de mais nada um animal social. A
cooperação social é essencial para a sobrevivência e a reprodução. Não é
suficiente que homens e mulheres conheçam o paradeiro de leões e bisões. É
muito mais importante para eles saber quem em seu bando odeia quem, quem está
dormindo com quem, quem é honesto e quem é trapaceiro”.
Matutando sobre essa teoria fascinante e
deliciosamente “incorreta”, ocorreu-me que essa fofoca primordial poderia estar
também na gênese das “fake news” que
envenenam as redes sociais hoje em dia. Como não tenho cérebro nem saco para
tentar fazer evoluir esse pensamento, resolvi transcrever um artigo
interessantíssimo publicado na edição 2575 da revista VEJA. O autor é José Francisco Botelho. Apesar de ter o mesmo
sobrenome que eu (a título de curiosidade, meu avô materno chamava-se Francisco
José Botelho), posso garantir que não temos nenhum parentesco, pois nem eu nem
nenhum dos meus parentes seríamos capazes de escrever de forma tão elegante e
agradável (perdoem-me, Botelhos de Minas Gerais!). Olhaí.
HISTÓRIA CULTURAL DAS FAKE
NEWS
As notícias falsas sempre existiram, mas jamais foram tão
velozes
"O RUMOR é a mais veloz das pragas malignas",
escreveu Virgílio, no Livro IV da Eneida.
"Horrendo monstro de pés rápidos, desconhece o sono, rasga a noite e
aterroriza cidades inteiras com sua mistura indiferente de mentiras e verdades."
Não precisamos recorrer à mitologia para constatar que a propagação de notícias
falsas é um costume tão antigo quanto a palavra escrita – e talvez coetâneo de
toda comunicação humana. Platão, na República,
apregoou a disseminação de "nobres falsidades" como necessário
cimento social para sua utopia de déspotas filosóficos.
Em 1522, o grande e desbocado poeta Pietro
Aretino tentou tumultuar as eleições papais publicando infâmias imaginárias – e
devidamente metrificadas – sobre os candidatos; na Inglaterra e na França do
século XVIII, caluniadores profissionais distribuíam misturas bem dosadas de
notícias reais com ficções comprometedoras, em temíveis panfletos que vindicavam
desavenças pessoais ou inimizades políticas. Ou seja: as fake news – expressão vaga, que adoto com relutância – não surgiram
com as redes sociais. Por outro lado, um breve lance de olhos ao cotidiano
virtual é suficiente para demonstrar que as novas tecnologias alteraram a forma
(ou a rapidez) com que essa antiga praga nasce, apodrece e germina:
"O que é a
verdade?", indagou Pilatos a Jesus Cristo; mas não teremos espaço para
responder ao legado da Judeia. Fiquemos, então, com o seguinte truísmo: com todas
as ferramentas de pesquisa hoje disponíveis, é relativamente fácil, mesmo ao
mais distraído consumidor de rumores, detectar informações suspeitas ou
infundadas. Ainda assim, a mentira – ou sua irmã mais perniciosa, a
meia-verdade – tende a prosperar. Em março, a revista Science divulgou uma pesquisa assustadora sobre a propagação de
notícias inexatas na internet. Após analisar 3 milhões de compartilhamentos no
Twitter entre 2006 e 2017, um grupo de cientistas do Instituto de Tecnologia de
Massachusetts concluiu que informações adulteradas têm probabilidade de
disseminação 70% maior que as notícias simplesmente factuais. A acreditarmos na
pesquisa, basta que uma notícia seja falsa para que tenha mais possibilidade de
triunfo. É como se o "horrendo monstro de pés ligeiros" fosse uma
sereia cuja sedução aumenta conforme o tom do falsete.
Os mesmos mecanismos
que permitem a multiplicação quase instantânea da falsidade podem servir para
desbancá-la e desmascará-Ia, com idêntica rapidez – mas isso não resolve o
problema, pois quem hoje é paladino da verdade pode ser o propagador de
notícias falsas da semana que vem. Para derrotar o monstro, é preciso admitir
que ele existe – e que está no meio de nós. Não somos inocentes; todos
gostamos, às vezes, de uma pitada confortável de imprecisão, de uma cálida
meia-verdade que nos afague as crenças. Dessa volúpia inata à espécie, só nos
salva o ascetismo mental: resistir à rumorosa sereia é lutar contra a própria
natureza humana. Uma luta sem quartel – e que, por definição, não acabará jamais.
Meu caro, talvez sejamos aparentados, sim. Embora eu seja gaúcho, meu avô -- de quem herdei o sobrenome Botelho -- era mineiro. Abraço!
ResponderExcluirSe for da região de Lavras, provavelmente sim. Obrigado pela "visita"!
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