Este é um post tão especial
que imaginei mais de um título para ele (e, até mesmo, não colocar nenhum): "Agora, chega!", "A
ficha caiu", "Cansei", "De saco cheio", "Rua sem saída", "Fim da linha",
"Carta de despedida" (acabei de dar um spoiler) e,
finalmente, "Um conselho de Bukowski".
Ora - direis - por que "um conselho de
Bukowski”? Certo perdeste o senso! E eu vos direi, no entanto, que é
um dos melhores conselhos que se poderia dar a alguém. Mesmo não apreciando seus
poemas pelo excesso de obscenidade e vulgaridade neles contidos (sou caretão,
entende?), não há como não seguir essas suas palavras:
“Não sejas como muitos
escritores, não sejas como milhares de pessoas que se consideram
escritores, não sejas chato nem aborrecido e pedante, não te consumas com
auto-devoção. As bibliotecas de todo o mundo têm bocejado até adormecer com os
da tua espécie. Não sejas mais um. Não o faças”.
Além dos títulos, fiz também várias
tentativas (algumas, bastante patéticas e ridículas) para escrevê-lo, cada uma com estados de espírito e intenções diferentes
(até mesmo antagônicas). Por isso, resolvi juntar todos os rascunhos, esboços e
anotações iniciais que fiz, para concluir este post (alguns estão restritos a
uma única linha apenas). Bora lá:
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Que eu posso dizer sem
ficar muito piegas? Tenho 68 anos, sou um homem idoso que finge ou brinca de
ter mente jovem, de ser espirituoso, antenado, culto e original. Talvez por
isso, consegui empanturrar o blog com mais de 1500 posts, verdadeiros monumentos
da presunção e mediocridade. Se, dentre esse universo eu conseguir tirar cinco
ou quatro, talvez três ou dois ou até mesmo apenas um que realmente tenha algum
valor, terá valido a pena manter o blog “positivo e operante” até hoje.
Segundo o Drummond, “As obras-primas devem ter sido geradas por acaso; a
produção voluntária não vai além da mediocridade”.
Mas não é isso que
realmente importa. O que faz a diferença é que não tenho mais nada para dizer
de minimamente interessante, divertido, criativo ou comovente. Nem paciência para ficar tentando! A sensação
presente é a de ser um burocrata que - mesmo esquecido em um canto da sala que fica depois do arquivo morto - se arrasta ao fim do dia para marcar seu cartão de ponto. E,
convenhamos, é bizarro um cara de 68 anos manter um blog só para fazer
gracinhas para um público inexistente. Mas deixo claro que fico feliz e
surpreso com a quantidade de visualizações alcançadas até hoje, ainda que
anabolizada pelos acessos (e excessos) esporádicos dos robôs do Google.
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Acho que vou deixar este post sem título nenhum.
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Não sei como escrever uma carta de despedida.
Se eu morrer até os setenta anos, será um alívio, pois não quero que meus
filhos e netas sintam vergonha de mim, da minha infantilidade, da minha
inadequação emocional.
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Quando tinha apenas vinte anos, o Vinicius de
Moraes escreveu o belíssimo poema "Velhice", onde faz uma
projeção do que poderia vir a ser. A seguir, um extrato do original.
Virá o dia em que eu hei de ser um
velho experiente
Olhando as coisas através de uma
filosofia sensata
E lendo os clássicos com a afeição que
a minha mocidade não permite.
Nesse dia Deus talvez tenha entrado
definitivamente em meu espírito
Ou talvez tenha saído definitivamente
dele.
(...)Serei um velho, não terei
mocidade, nem sexo, nem vida
Só terei uma experiência
extraordinária.
Fecharei minha alma a todos e a tudo
Passará por mim muito longe o ruído da
vida e do mundo
Só o ruído do coração doente me
avisará de uns restos de vida em mim.
(...) Serei um corpo sem mocidade,
inútil, vazio
Cheio de irritação para com a vida
Cheio de irritação para comigo mesmo.
O eterno velho que nada é, nada vale,
nada teve
O velho cujo único
valor é ser o cadáver de uma mocidade criadora.
Lindo, não? Até onde imagino, ele ficou bem
distante dessa "receita". Para mim, entretanto, ela é perfeita. Em
outras palavras, "esse
cara sou eu". E isso tem-me incomodado. Hoje, assumida a velhice de
forma definitiva, vejo uma grande inadequação no fato de um idoso de 68 anos
ter um blog onde age e escreve como se fosse adolescente.
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O que acaba primeiro - os
sonhos, um blog ou a vida? Para mim, no meu caso, a ordem é exatamente esta:
primeiro vão-se os sonhos; a partir daí, o blog é abandonado. E a vida, até
quando Deus quiser. Estava pensando sobre isso, sobre dois blogs que acompanhava.
Um, simplesmente desapareceu; o outro emudeceu (deve ter erro de gramática
nesta frase, mas fica assim mesmo).
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Tenho tido tão pouca
inspiração que nem consigo escrever uma carta de despedida decente. Aliás, estou sem saco nenhum para ficar pensando em "velhidades". Por isso, a
partir de agora, aproveito um texto que surgiu há mais tempo. Antes, porém, um
verso escrito pelo poeta Torquato Neto:
Adeus, vou pra não voltar e onde quer
que eu vá, sei que vou sozinho
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Este texto foi escrito já faz algum tempo.
Por ser um texto depressivo (como a maioria dos recentemente postados), ficou
hibernando um pouco. Não o escreveria hoje, pois meu punho está doendo e estou
sem muita paciência para ficar choramingando (como na maioria dos
recentemente postados). Mesmo assim, chancelo - com algumas reservas - tudo o
que foi escrito antes.
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Este é um post sem título. Também não está
indexado a nenhuma das "seções" do blog. A razão para esta escolha
encontra-se no final do texto. O que importa agora é saber que ao longo do
tempo em que os mais de 1500 posts foram sendo publicados, uma imagem de mim mesmo, fragmentada, mas cada vez mais incômoda, foi
se formando. Cada post acrescentava um fragmento ao mosaico que surgia. Pouco
importa se os temas eram lançados nessa ou naquela "seção", se
contavam casos da infância ou piadas imbecis, pois cada novo pedaço traía a
origem única, encharcada de desesperança, solidão, ironia ou desespero, raiva,
medo ou depressão. Qualquer que fosse o sentimento predominante, o GPS apontava
sempre as mesmas coordenadas.
O que sei é que esse mosaico foi revelando
uma personalidade só levemente percebida por mim (e até mesmo negada): uma
pessoa egocêntrica, vaidosa, invejosa, neurótica, um pouco sádica, presunçosa,
mesquinha, insegura, pedante, rancorosa, falsa (muito falsa), desprovida de
compaixão, fútil, imatura e medrosa (muito medrosa). E, principalmente,
ridícula e infantil.
Não é nada agradável descobrir isso de
alguém, ainda mais se esse alguém é você mesmo. Talvez eu tenha passado toda a
minha vida tentando não ser assim ou escondendo esse lado degradado. Talvez
seja esse o motivo de ter citado tantas vezes o retrato de Dorian Gray (mesmo
sem nunca ter lido o livro), o personagem Mr. Hyde (d'O médico e o monstro)
e de achar que o Poema em Linha Reta traça meu perfil de modo fiel.
Minha vida hoje está uma merda, tenho sentido
medo de tudo, um medo tão abrangente que faz com que eu tenha vontade de estar
morto, mesmo que não pense em me matar (pelo menos, não ainda). Não sinto graça
mais em nada, tenho uma melancolia permanente, não tenho vontade de fazer nada
e tenho medo de que os fragmentos que faltam para completar meu mosaico apenas
tornem mais agudo esse sentimento. Perdi a inspiração até para falar idiotices.
Por isso, tomei a decisão de dar um tempo no velho Blogson. Hoje, sinceramente, espero que esse tempo seja infinito.
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Tenho sessenta e oito anos, descobri que
tenho esteatose hepática (gordura visceral que pode levar à cirrose
hepática ou a um transplante) e “ateromatose carotideana e em artéria
vertebral esquerda” (sabe lá Deus o que isso significa). Então, não posso
ficar com cara de paisagem, acreditando que tenho "todo o tempo do
mundo". Não tenho. Além disso, está faltando tesão, nada mais me
interessa. Este blog foi diversão e frustração, espelho ou holofote, um
palanque para meus desabafos, um touro metálico aquecido onde eu entrava para
urrar minha dor existencial. Depois de hoje, não quero mais fazer isso, pois ficam cada vez mais risíveis esses desabafos. Por esse motivo e diante de tudo
o que falei, resolvi dar um tempo no blog.
Mais uma vez, agradeço a cada um dos leitores que fizeram
algum tipo de comentário (especialmente à “J” – que sumiu e ao “Marreta”
- que resistiu até hoje). Agradeço também aos que nunca fizeram nenhum
comentário, pois todos contribuíram para muitos momentos felizes que vivi.
Também lamento que o "Ozymandias Realista" tenha começado a
seguir o blog só agora, em seu ocaso.
Como não pretendo remover o Blogson, que ele
fique “à deriva”, flutuando sem rumo e sem combustível no oceano poluído da
internet. Podem fazer o que quiserem (ou não) com os posts. Os comentários que
porventura surgirem serão publicados em algum momento, mas não necessariamente
respondidos.
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Esta é uma “carta de despedida” endereçada a
todos que acessaram o Blogson Crusoe desde sua criação. Agradeço a todos que
comentaram algum post e também aos que nunca comentaram nada, pois o simples
fato de acessar o blog sempre foi motivo de muita alegria para mim. Agradeço
especialmente ao titular do “A Marreta do Azarão” e à titular do desaparecido “Elemento
Jota”, responsáveis pela quase totalidade dos
comentários feitos.
Mas, por que uma carta de despedida? Porque o
blog transformou-se em uma droga viciante – ou fui eu que me tornei um
drogadicto do blog (um blogadicto, talvez). E quando eu comparo o blog a uma droga
eu me refiro à sua semelhança com as drogas que causam dependência no usuário.
O início é sempre bom, agradável e divertido. Com o passar do tempo, pode
acontecer desse usuário resolver abandonar o vício, mas aí é que o bicho pega.
E é isso que tem acontecido com o blog: longe me fazer bem, tem-me feito muito
mal.
Obviamente a razão disso é o esgotamento da
criatividade e do que fazer. Cada novo post tem saído pior que o anterior, mais
espaçado, de parto mais difícil. Por isso, eu preciso voltar para o mundo real
(mesmo que esse mundo seja um porre). E o problema é que não sei como desligar
essa merda, essa obsessão doentia. Assim, só vejo uma solução: dar um tempo, paralisar a ânsia de postar coisas "novas" sobre meu umbigo que não interessam a ninguém. Se der vontade de voltar, volto. Se não der, não deu.
A título de encerramento, transcrevo uma
frase grafitada que encontrei recentemente: “Eu
finjo que sou artista e a sociedade que é crítica de arte”. A partir de agora não finjo mais. See you later alligator! (preciso urgente inventar alguma coisa para fazer)
NOTAS "POST MORTEM":
Depois da morte
do velho Blogson, fiquei agitado, inquieto, sem saber o que fazer. Talvez pela
força do hábito, às vezes tinha vontade de escrever alguma coisa, mas não tinha mais um lugar para isso. Tentei investir no Facebook, mas a cada tentativa de fazer humor ou a cada imagem provocativa que postava, em vez de reações de riso, recebia comentários
seríssimos, contestando ou aprovando o que eu havia dito só por diversão.
Por isso, depois
da “missa de sétimo dia” do Blogson, decidi
que precisava criar novo blog, pois ressuscitar o blog pela segunda vez
demonstraria uma imensa falta de caráter (que, aliás, não tenho mesmo) e
serviria de motivo para piadas.
Resolvi então
criar o “Lingüiça no Fumeiro”, um
blog ao estilo do Blogson, mas sem a preocupação das postagens frequentes e sem
o “auxílio luxuoso” de outros autores. Em outras palavras, o Lingüiça será (é) um blog cem
por cento autoral, mesmo que essa porcentagem não se reflita na qualidade dos
posts. Significa apenas que os textos, desenhos e melodias de outros autores
que enriqueciam o Blogson não serão encontrados no novo blog. Ou seja, o Lingüiça será uma espécie de primo ou irmão mais
pobre do falecido.