domingo, 2 de novembro de 2025

NASCIDOS NA FAZENDA - 04

Eu terminei a terceira parte desta série de lembranças falando de um sujeito que tinha um apetite sexual do tamanho da Muralha da China.

Pois bem, Sô Chico trabalhou durante anos para esse sátiro. Se comparada à performance desse médico, a “escapadinha” de meu avô nem seria digna de nota. Exceto para minha avó e seus filhos. Vovô teria conhecido sua segunda mulher, Amélia, durante a construção do aeroporto do Carlos Prates. Segundo minha irmã, tia Ci, mamãe e tio Nem contaram a ela a mesma versão.

Esse assunto era quase tabu na família. E, claro, quanto mais o tempo passa, mais tende a ficar providencialmente esquecido. Afinal, os “vértices” desse “triângulo das Bermudas” já morreram há muito tempo. Mas ainda me permito especular como tudo começou. “Sô Chico” era um sujeito “sacudido”. (termo antigo que pode ser entendido como saudável, forte, por aí). Talvez, em um fim de semana qualquer, talvez não tivesse nada para fazer... Já disseram que “mente vazia é a morada do capeta”. Aí,... Bingo! Ou Bang.

Alguns filhos levavam isso numa boa, pelo menos os mais moleques (tio Nem, Omir e Mon). De vez em quando, se esse assunto surgia e tia Aidê estava longe, comentavam alguma coisa e riam, fazendo blague da traição do pai.

Eu sempre achei que alguns dos filhos dessa Amélia fossem também de meu avô, talvez por um comentário feito uma vez por minha mãe. Segundo ela, o caçula da segunda família parecia-se muito com o Almon, seu irmão mais novo. As informações fornecidas recentemente por minha irmã desmentem essa suposição. Pelo sim, pelo não, fica a dúvida.

“A mãe dela (que parece era uma mulher meio "pra frente" pra não dizer coisa pior) servia a refeição para os trabalhadores, inclusive o Vô e empurrava a filha de todo jeito para algum deles, porque ela, Amélia não sei se tinha sido abandonada pelo marido ou se tinha ficado viúva e com três filhos pequenos, dois meninos e uma menina. O Abel, um dos que trabalhou com o Vô nessa época e era motorista da obra (e foi talvez a pessoa que tenha contado tudo pra Vó), também afirmava que os filhos da d.Amélia eram do marido (policial) e que o Vô se encarregou de criá-los. O filho dela que conversou com a tia Aidê pelo telefone tinha ou tem o apelido de Bolinha (ele trabalhava como investigador) e tio Nem o conheceu pessoalmente; esse moço disse a mesma coisa para tia Aidê e para o tio Nem, que considerava o Vô como pai porque ele os criou, mas que ele e os irmãos não eram filhos legítimos dele, eles inclusive tinham o sobrenome do pai. A moça virou freira. E o Abel (ele morava aqui na Lagoa) contou pra mamãe, que a d. Amélia faleceu um ano depois do Vô”.

O fato é que, aos sábados, depois de almoçar, meu avô avisava que ia visitar os parentes. E saía quase que arrastando os pés – “de tanto trabalhar”, segundo ele. Entretanto, bastava atingir a esquina para pegar uma velocidade digna de marcha olímpica. Minha mãe e meu pai comentavam isso, rindo.


Vovô gostava muito de mim - e eu dele. Depois que me casei, eu ficava às vezes até um mês sem ir à casa de minha avó. Ele reclamava que eu não ia vê-lo, essas coisas. E eu sempre prometia visitá-lo com mais frequência, promessa sempre descumprida, até porque não tinha carro.

Um dia, meu chefe chega com a notícia fatal: meu avô tinha sido atropelado e estava no CTI (provavelmente) do Hospital São Lucas. Creio que até nos deu carona. Alguns primos e tios estavam lá, do lado de fora, meio atarantados. Não me lembro se no mesmo dia ou no dia seguinte, recebi a notícia de seu falecimento. Aquilo me doeu muito, ainda mais porque eu realmente pretendia visitá-lo no fim de semana seguinte. Depois, talvez no velório ou na missa de sétimo dia, fiquei sabendo de mais detalhes. Tinha sido atropelado na Niquelina ao perder o equilíbrio, quando tentava atravessar a rua. Detalhe: indo ou vindo da casa de sua segunda família.

Foi socorrido por alguém que o conhecia da região. Ainda consciente, pediu ao amigo: “Não me deixe sozinho”. Creio que foi tia Aidê que me contou ter recebido um telefonema de um de seus “meios-irmãos”, com o seguinte recado: “não se preocupem, nós não iremos ao enterro, não queremos envergonhá-los”.

Esse tipo de coisa me deixa perplexo: se não havia nenhuma herança para repartir (o que tornaria tudo muito mais difícil), porque comprar a mágoa de uma mãe já falecida? Porque não conhecer, porque evitar relacionar-se com pessoas que, afinal, também poderiam ser seus irmãos? Meu avô morreu em 1976 com 76 anos, quatro anos depois de minha avó.

Até hoje, quando vejo alguém cujos traços se parecem com os de meu tio Almon, me pego perguntando: “será que é meu parente?”


sábado, 1 de novembro de 2025

NASCIDOS NA FAZENDA - 03

E aí vai mais um capítulo das "Memórias Sentimentais de Jotabê" (isso é só enrolação, só uma piadinha, entendeu?). Vamos lá:


Vovô Chiquinho nasceu em 15 de março de 1900. Vovô, não, que esse tratamento era dado por meu irmão e primos (minha irmã o chamava simplesmente de “Vô”). Eu o chamava, sem nenhuma cerimônia, de “Sô Chico” (da mesma forma que falava “Seu Amintas” e “Dona Lia”, quando conversava com meus pais). E o engraçado é que ele gostava disso, dessa falta de modos (meus pais também). Uma vez minha mãe comentou o que vovô tinha dito a meu respeito: -“esse aí me puxou!” Que eu posso dizer disso? Que o discernimento dele era péssimo.

Chamava-se Francisco José Botelho e era filho de Lino José Martins e Januária Antônia de Oliveira Botelho. Perguntada o porquê de o sobrenome de seu pai ser “Botelho” e não “Martins”, tia Aidê não soube explicar. Fico pensando que, na virada do século XIX para o XX, os cartórios de registro civil deviam ser uma zona, a verdadeira casa da mãe Joana.

Outra “reflexão”: se vovô tivesse se chamado “Francisco José Martins”, eu não teria uma insinuação de ato sexual no nome (“Botelho Pinto”), para me acompanhar o resto da vida. Não à toa, alguns colegas me tratavam respeitosamente por “Botei-vos” “Censurado” e mais uma penca de variantes e sinônimos, na mais pura sacanagem. E, numa boa, eu sempre me diverti com isso. Mas isso já é outra história.


É possível ver meus bisavós, já velhinhos, em duas fotografias espetaculares ainda existentes na casa de minha irmã. O casal teve esses filhos, não necessariamente na ordem em que estão relacionados:

Olinta, Onésio, Odila, João, Francisco (meu avô), Waldemar, Odorêncio (esse nome só empata em feiura com Laldomila, que era irmã de minha avó) e Humberto.

Creio que com exceção de tio João, todos os outros moravam em Lavras. Alguns nunca cheguei a conhecer. Lembro-me que tio Waldemar e - em datas distintas - tio Dorenço (Odorêncio) foram uma vez à nossa casa. Creio que foi um deles que trouxe um litro de um molho saborosíssimo, feito com “trezentos” ingredientes diferentes.

Tio Humberto ou “tio Beto”, como todos falavam, era dentista e teve três filhas com nomes que me encantavam: Ábia, Hebe e Íbia (ou coisa parecida). Lembro-me da Ábia, uma moça com bochechas bem acentuadas, que se casou por procuração com um português. Chique!

Tio João sempre ia lá em casa, assim como algumas de suas filhas. Depois que comecei a namorar minha mulher, uma de minhas cunhadas, um dia, perguntou se eu tinha um tio, talvez tio-avô, conhecido como João Botelho. Era o próprio. Meu tio era o avô de seu namorado na época, o Roberto Bocão. O engraçado é que graças a esse namoro eu conheci e fiquei amigo de um primo distante (de terceiro grau). Ele e seus irmãos são os únicos que conheço e com quem converso esporadicamente, pois os pais moram em frente à casa de minha sogra (o mais conhecido é o Serginho, que, em uma noite de Natal, depois de tirar meleca do nariz veio me estender a mão despreocupadamente, fazendo uma de minhas noras quase desmaiar de rir).

Tempos depois de terminado o namoro com minha cunhada, fomos convidados para o casamento do Bocão. Nessa época meu avô já tinha morrido. Quando vi meu tio-avô sentado na igreja, fiquei com uma vontade danada de ir abraçá-lo, mas desisti. Afinal, ele me conheceu criança e talvez não fosse se lembrar de mim. Se eu o tivesse abraçado, de certa forma estaria também abraçando meu avô. Hoje penso que devia ter feito isso. Tio João permaneceu lúcido até os 102 anos e morreu um ano depois.


Nunca entendi por que só os irmãos de meu avô e de minha avó eram bem de vida (quase todos, pelo menos). Em suas visitas dominicais, eram casos de fazenda pra cá, boiada prá lá, por aí. Meus avós, coitados, estiveram sempre na merda – ou perto disso. Consultando minha irmã sobre datas e fatos para escrever estas lembranças, surgiu a explicação para essa ostentação domingueira (pelo menos, no que se refere aos irmãos de minha avó).

Minha mãe e seus quatro irmãos mais velhos nasceram em uma fazenda localizada em Ijaci, distrito de Lavras na época. Depois, mudaram-se para outra fazenda em Pedro Leopoldo, onde nasceu Tio Tôto. Nova mudança de fazenda e de cidade e mais um nascimento: tia Dalva nasceu na Fazenda da Pedra Branca, em Capim Branco.

Segundo tia Aidê, seus pais iam se mudando junto com a Dindinha, mãe de minha avó. As fazendas teoricamente eram dela, mas quem fazia os negócios eram seus filhos homens e, à medida que vendiam as propriedades da mãe, “compravam outras menores e embolsavam uma parte, até restar só a casa da Floresta”. Puta sacanagem. E meu avô trabalhava para ela, Dindinha. Tia Aidê disse que “de genro ele virou o ‘faz-tudo’ enquanto os cunhados ficavam só no ‘bem bom’”.

Talvez por esse motivo, meu avô começou a trabalhar como “construtor”, um termo que se usava ainda na época de minha formatura. No duro, no duro, essa função é exercida hoje pelos “mestres de obras” ou “encarregados gerais”. Em uma época de poucos engenheiros, o prático tinha mercado de trabalho garantido.

Sei de poucas obras que meu avô administrou (ou construiu, como dizia). Uma delas é uma chaminé tronco-cônica, feita com tijolos, provavelmente necessária para algum forno, caldeira ou coisa parecida. Essa chaminé ainda deve existir e fica ou ficava quase na beira da lagoa, próximo à vila residencial da Aeronáutica, em Lagoa Santa.

Outra obra, onde fui ainda pequeno com ele, é um conjunto de casas construído em frente ao Clube dos Oficiais, no Prado. Essas casas eram de propriedade do Antônio Luciano, um sujeito riquíssimo e com um apetite sexual extraterrestre.

Vale a pena falar um pouco desse sujeito: décadas atrás, a prefeitura de Belo Horizonte resolveu criar oito novos parques na cidade. Seis deles seriam construídos em terrenos do tal Luciano. O procedimento era simples: as áreas seriam desapropriadas, a PBH pagaria uma mixaria para os proprietários e fim.

Ao saber dessa intenção, imediatamente mandou fazer projetos de urbanização e loteamento dessas áreas e deu entrada na prefeitura. Com isso, os imóveis adquiriram novo status e novo valor. Resultado: essa manobra inviabilizou as desapropriações e a ideia foi enterrada. Creio que uma dessas áreas é hoje o bairro Camargos, em frente ao Minas Shopping, do outro lado da Cristiano Machado.

O Luciano (Dr. Luciano, como vovô se referia a ele) era dono de quase todos os cinemas de Belo Horizonte, aliás, os melhores. Dizia-se que tinha uns oitenta mil imóveis só em Beagá (!). Mas sexo é o assunto em que esse médico (era médico, o sacana) era um craque, pois deixou dois filhos legítimos de seu casamento, uns quarenta outros foram reconhecidos como filhos naturais, com direito a herança, e existem ainda mais de cem que brigam ou brigaram na justiça para ser também reconhecidos como descendentes desse super-coelho. 

Para ele, vale uma frase que ouvi quando fizemos curso de noivos. Ao escutar um dos noivos dizer que tinha 26 irmãos, o orientador perguntou: -“seu pai teve tempo de vestir as calças?” Cagamos de rir.


sexta-feira, 31 de outubro de 2025

NASCIDOS NA FAZENDA - 02

Os pais de minha avó chamavam-se (olha o tempo se movendo!) Joaquim Carlos Pereira de Alvarenga e Alda Augusta da Costa (Dindinha). Quando o Joaquim casou-se com minha bisavó ele era viúvo e pai de cinco filhos, que ela acabou de criar: duas moças de nome ignorado ("não lembrado"), tio Quinca, tio Chiquinho e tio Custódio. Uma das filhas, talvez a mais velha, teve um filho apelidado de Juca, que protagonizou um dos casos bizarros da família.

Segundo ouvi algumas vezes de minha mãe, tia Chana era casada com seu sobrinho (!). Tinha o apelido de Juca Barão e já era bem velho quando íamos visitá-los na Rua Floresta, onde moravam. Essa consanguinidade maluca atingiu os quatro ou cinco filhos do casal, mas não me lembro como. Pois bem, minha mente infantil, de criança, não conseguia assimilar essa história: "
- Como é que pode, casada com o sobrinho? Mas eles parecem ter a mesma idade!”

Bem, minha mente não é mais de criança, mas permanece ainda meio infantil. E olha que meus pais nem eram parentes!... (piada muito ruim!)

A explicação é simples: tia Chana, que era filha do segundo casamento de meu bisavô, casou-se com um “meio sobrinho”, pois o tio Juca, seu marido, era justamente o filho de uma de suas duas irmãs do primeiro casamento. Convenhamos, não deixa de ser uma situação meio bizarra, meio incestuosa.

No post anterior eu mencionei a existência de uma foto antiquíssima da família de minha avó materna. Recentemente, recebi de minha irmã uma cópia escaneada da tal foto. Uma das tias avós estava ausente e foi inserida depois, usando-se o photoshop da época (tesoura e grude ou goma arábica). Esse retrato deve ter sido tirado entre 1915 e 1920(!). A título de curiosidade, fiz um "Onde está Wally", um "Who's Who" da foto. Olhaí.



Antes de prosseguir com as lembranças, preciso esclarecer uma coisa: como não sou espírita (espiritualista), para mim as pessoas permanecem “vivas” apenas enquanto alguém conseguir lembrar-se delas, enquanto puderem ser identificadas por fotos, casos de família ou documentos. E há casos de família que, mesmo sendo um pouco constrangedores para algum de meus tios, iluminam a personalidade de quem os protagonizou. Por isso, mesmo que não queira magoar ou ofender ninguém (pelo contrário!), este texto pode ter algum deboche, alguma “falta de modos”. Mas assim é a vida, é assim que eu a vejo. E, afinal, nunca é demais lembrar que parte do que sou, das influências que recebi, vêm dessa família, com quem convivi diariamente por 24 anos.



Minha avó nasceu em 05/01/1898 e era dois anos mais velha que meu avô. Certamente por vaidade, mentia o ano de nascimento. Para mim, tinha nascido em 1900. Só quando ela morreu fiquei sabendo a data certa, gravada na lápide da sepultura. Era muito, muito magra. Se tivesse sido calculado, certamente seu IMC seria inferior a 18. E “feinha”, na opinião de uma senhora que a conheceu.

Fiquei conhecendo essa senhora (D. Zizinha) por puro acaso, pois ela era a proprietária de uma casa semi-abandonada na rua onde moramos. Chegamos a pensar em comprar esse imóvel e, por isso, às vezes telefonava para ela. Essa senhora tinha uma visão desencantada e sarcástica da vida, com comentários ácidos e cortantes. Talvez por isso, eu gostava de conversar com ela. Nessas conversas que mantivemos, por mais incrível que pareça, descobri que ela conhecia minha família, que era sobrinha ou prima do tio Juca Barão e que tinha sido muito amiga de minha mãe na adolescência, a quem definiu como “muito bonitinha”, em contraponto à minha avó, “muito feinha”. Segundo essa senhora, meu avô era “bonitão”. Eu nunca soube se houve casos (no plural) de infidelidade de meu avô, apenas transcrevo a frase que ouvi de Dona Zizinha: “o Chiquinho não era fácil”.

Outra lembrança de minha avó, quando ainda estava lúcida. Um dia, alguém chegou à nossa casa para entregar a parte da herança paterna ou materna que lhe coube – um conjunto de louça sanitária decorada, muito bonito, composto de bacia, jarro, saboneteira e penico, esses dois com tampa; um cesto de palha com fundo quadrado, tão usado que tinha um furo em um dos cantos, e mais alguma tranqueira de que não me lembro. Essa “maravilha” de herança provocou outro colapso nervoso. Também, pudera: imóveis, fazendas, gado e sei lá o que teriam sido repartidos entre os irmãos (creio que só entre os homens).

Pra finalizar este post, outra lembrança: minha avó comprou de seu sobrinho Orlando, filho de tia Anita, um terreno em Lagoa Santa. Conforme apalavrado, o terreno teria determinada área, definida em alqueires. Ao ser passada a escritura, o terreno tinha minguado para 30.000 m² ou coisa parecida. O certo é que a área entregue equivalia a um terço do oferecido. Consequência? Um bate-boca gigantesco com o sobrinho filho da puta e novo colapso nervoso. Esse terreno foi depois comprado por meu pai e colocado em nosso nome (maldita ideia!).

Já contei outros casos de minha avó neste blog. Se alguém tiver interesse, são eles:
 http://blogsoncrusoe.blogspot.com.br/2014/09/lets-all-get-up-and-dance.html
http://blogsoncrusoe.blogspot.com.br/2014/10/voce-sabe-falar-alemao.html  

Antes de passar para meu avô, preciso registrar que minha avó foi, sem que eu me desse conta disso até agora, uma figura central nas primeiras décadas de minha vida, com todas as suas dores e decepções, a verdadeira fêmea alfa da família (obrigado, Nat Geo). 

quinta-feira, 30 de outubro de 2025

NASCIDOS NA FAZENDA - 01

“Qualquer vida, se tem o narrador certo, merece um livro ou, pelo menos, um capítulo”. O autor desta frase magnífica é o jornalista Diogo Schelp, que a construiu para comentar na revista Veja um livro recém-lançado.

Tomo a liberdade de usá-la para apresentar a série de seis posts que começam a ser divulgados a partir de hoje. O assunto, claro, são lembranças de pessoas com quem convivi. No caso particular, meus avós maternos. Não creio ser o “narrador certo”, talvez seja apenas o único – e mais errado que certo.

Tal como os posts já divulgados sobre a família de meu pai, este é parte de um texto maior, ainda inacabado, que comecei a escrever em 2013 para deixar para meus filhos (caso eles queiram saber). O tema são as lembranças que tenho sobre a família de minha mãe. Não pensava em divulgá-lo no blog, por uma série de motivos. Primeiro, por estar inacabado, pois não consegui dar continuidade no perfil de metade dos tios. Além disso, está o fato de que a maioria dos tios ainda está viva. E meus comentários e lembranças descritas não se enquadram na cartilha politicamente correta nem na linha chapa branca.

Apesar disso tudo, resolvi divulgar um pouco dessa memória no Blogson. E o culpado é o meu amigo virtual Marreta do Azarão, que disse ser minha "verdadeira veia literária" as memórias. Assim, antes que minha memória acabe de vez, vamos falar um pouco da véia, ou melhor, vamos exercitar a veia. E o assunto começa justamente com a família de minha avó materna. Vamos lá.


Quando eu nasci, em 1950, meus pais e meu irmão já moravam na casa de minha avó materna. Minha avó teve onze filhos, mas um deles morreu ainda pequeno. Minha mãe era a segunda mais velha e foi também a segunda a se casar. Todos os filhos, com exceção de tia Ci, casada com tio Tristano, moravam nessa casa. Como a casa era pequena, barracões (edículas) foram sendo construídos para abrigar esse povo todo e mais meu avô, que, embora separado de minha avó, morava lá também, em um quarto de um dos barracões existentes no fundo do imóvel.

Comparados com meus tios paternos, metade deles nascida antes de 1900, os irmãos de minha mãe eram verdadeiras crianças, pois a tia materna mais velha (tia Ci) é mais jovem que a caçula da família de meu pai (tia Zinha). Por isso, apenas para registro e ordenação, transcrevo os dados fornecidos por minha irmã, tal como fiz com os irmãos de meu pai:

Tia Ci (Araci), minha madrinha de batismo, nasceu em 19/02/1919. Em 19/12/1920 nasceu minha mãe. Meu tio e padrinho Moacir (Cici) nasceu em 25/04/1925. Tio Nem (Manoel) nasceu em 02/07/1926.

Tio Tôto (Walter) nasceu em 28/05/1928. Em 30/07/1929 nasceu tia Dalva. O próximo foi Omir (não “tio Omir”, apenas e tão somente, Omir), nascido em 14/07/1931. Depois dele, veio tia Aidê, nascida em 24/08/1933. A mais nova das mulheres, tia Marisa, nasceu em 15/12/1935. O último tio - Almon (Mon), apenas dez anos mais velho que eu, nasceu em 05/04/1940.

Meu tio José (epa!, de novo) foi o terceiro filho a nascer, ficando entre minha mãe e tio Cici. Segundo tia Aidê, morreu com onze meses, vítima de uma variante mais branda da famosa gripe espanhola. Parece que nessa mesma época suas tias Anita e Domila também perderam bebês, vitimados pela mesma doença. Uma coincidência não muito simpática (para mim, pelo menos) é o fato de os dois tios “José”, um por parte de pai e outro por parte de mãe, terem morrido na infância.

Uma coisa que eu nunca entendi é o bailado dos sobrenomes de minha avó e de meu avô, que se alternavam na composição dos nomes dos filhos. Meu avô chamava-se Francisco José Botelho. Minha avó, Julieta Alvarenga Costa. E os filhos ficaram assim:
Tia Ci (Alvarenga Botelho); minha mãe, Lia (Alvarenga Botelho); tio Cici (Botelho Alvarenga); tio Ném (Botelho Alvarenga); tio Tôto (Botelho Alvarenga); tia Aidê (Botelho Alvarenga); tia Dalva (Alvarenga Botelho); Omir (Botelho Alvarenga); tia Marisa (Alvarenga Botelho) e Mon (Botelho Alvarenga). Parece que essa ideia maluca teria sido de meu avô. Sei não, mas ele deve ter fumado algum tipo de cipó ou fumo de rolo jamaicano, na época. Também nunca entendi porque foi usado o “Alvarenga” de minha avó em vez do sobrenome “Costa”.

Como vivi nessa casa durante 24 anos, até me casar, as lembranças vão se justapondo e se embaralhando muito. Por isso, recorri algumas vezes à minha irmã, que me forneceu datas, nomes e casos que eu já tinha esquecido ou, mesmo, que desconhecia. As transcrições literais do que ela me enviou estão entre aspas e em itálico. E, para tentar ordenar um pouco essa bagunça, preciso falar de cada uma dessas pessoas isoladamente. E vou começar por minha avó.


Seu apelido era Lêta. Não sei onde nasceu, mas tinha uma penca de irmãos, como era costume naquele tempo (e depois tem gente que critica a televisão!). Esses irmãos iam visitá-la de vez em quando. Colocados na ordem de idade, lembro-me do tio Juquinha (José), tia Chana (Emerenciana) e tia Anita (Ana), uma senhora gorda e metida, por quem nunca tive simpatia. Era casada com tio Olímpio.

Depois, vinha tia Domila (Laldomila), casada com tio Custódio ou Custodinho, para diferenciar de outro irmão de minha avó, ele também Custódio. Além do nome alucinógeno, tia Domila seria fácil, fácil uma personagem de história em quadrinhos, mais precisamente irmã da bruxa Alcéia, das histórias da Luluzinha. Sinceramente, ela era feia pra caramba, com seu nariz mega adunco e aqueles olhos... bem, os olhos eram parecidos com os meus, arregalados e com bolsa e tudo. Uma bosta.

O mais engraçado é que o marido, tio Custódio (Custodinho) morria de ciúmes dela. Uma de suas filhas, Alda, sempre honrou com muito mérito a feiura da mãe. De tão magra, usava (ou usa) duas calças compridas, “para engrossar a perna”. Separada do marido (porque será?) e aparentemente meio ninfomaníaca, quando era mais jovem ia para a Avenida Paraná (coisa muito fina!) para descolar algum motorista ou trocador. Não é invenção minha! Quando eu namorava a minha mulher e o ponto final do meu ônibus era na Paraná, cansei de vê-la por ali, nos sábados à noite. Morria de vergonha.

Continuando com os tios-avós, vinham o Oscar e o Neca (Manoel). Minha avó era a segunda mais nova. Esse pessoal todo morava no bairro Floresta.


Alguns anos atrás, minha tia Aidê mostrou-me uma fotografia sensacional, que, contada de hoje (estamos em 2013), deve ter de noventa a cem anos. Nesse retrato, com aquelas caras de foto posada de antigamente, estão meu bisavô, minha bisavó – que era sua segunda esposa – e todos os filhos do primeiro e do segundo casamento. Minha avó aparece como uma jovem de, no máximo, vinte anos. Essa fotografia e a informação de que meu bisavô foi casado duas vezes esclareceram uma das coisas que mais me intrigavam, relacionadas à Tia Chana.

quarta-feira, 29 de outubro de 2025

NOITES DA INFÂNCIA - A REVANCHE

Com este post encerram-se as lembranças que tenho da família de meu pai e, em especial, dele mesmo.

Quando a indústria cinematográfica americana produz um sucesso estrondoso de bilheteria, um blockbuster, sempre resolve fazer uma continuação para faturar mais um pouco.  E não estão errados, mesmo que às vezes a continuação não mantenha a qualidade alcançada no original.

Jotabê, que é menos bobo do que aparenta ser (a diferença é imperceptível), também age assim. Como o post “Noites da Infância” teve boa aceitação, porque não tentar enfiar (no sentido figurado, lógico) uma segunda parte nos milhares de leitores do Blogson? Então é isso.

O TICO-TICO
No post original eu mencionei a revista O Tico-Tico e os personagens Faustina e Zé Macaco, que foram tomados de empréstimo por meu pai para suas histórias delirantes. Pois bem, resolvi desencavar o único exemplar d'O Tico-Tico que tenho e escanear a capa, onde aparecem os dois personagens citados. Na verdade, não é uma revista normal, é um almanaque que saiu no final de 1956 e foi dado de presente de Natal para meu irmão.

Não sei por que ele não se interessou em ficar com o almanaque. Talvez pelo fato de ter um defeito grave de montagem, pois várias páginas aparecem repetidas. Provavelmente esse pode ter sido o motivo de não ter nenhuma história dos personagens que aparecem na capa do almanaque de 1957. Não importa. Quando minha irmã perguntou ao “Sr. Memória” aqui se queria ficar com ele, a resposta foi –“Lógico!

Como nesse almanaque os personagens são apenas esboçados, como se feitos por uma criança, resolvi buscar na internet uma imagem melhor, a capa de um almanaque de 1954. Nas duas capas o Zé Macaco é facilmente identificável (porque será?) e a Faustina mais ainda, pois é a única mulher que aparece, com seu nariz imenso. Nessa época eu tinha uns seis anos ("o tempo passa, o tempo voa...").





PROPULSÃO A JATO
Essa história, que já era ridícula, ficará agora um pouco mais. Na casa de minha avó não se diziam palavrões nem palavras vulgares. Havia um certo pudor, um certo recato, mesmo que falsos (foram quebrados por minha avó, ao soltar alguns palavrões, já demente).

Assim, a propulsão obtida através da ingestão de batata doce pela heroína peidorreira, nunca foi identificada dessa forma. “Peido” não era uma palavra de bom tom na minha família. Como ninguém conhecia a palavra “flato” (que eu mesmo só vim a conhecer há uns dez, quinze anos), o termo usado era (já estou rindo de novo) “funfa”. Assim, lá em casa ninguém peidava, soltava “funfas” ou, na pior hipótese, “funfava”.  Dureza, não?

(13/02/2016)

NOITES DA INFÂNCIA


Faz algum tempo que deixei minhas memórias de lado, mas algumas já estão registradas e programadas. Como existem alguns que gostam de ler os "causos" que eu conto, resolvi contar um pequenininho, só porque está intimamente ligado a meu pai. Quem lê o que escrevo sabe que não sou nada condescendente com "Seu Amintas" (forma de tratamento usada por mim depois que me casei) e que falo o que penso dos seus defeitos e temperamento irascível.

Falar de forma pouco elogiosa sobre ele não significa que eu não amasse Seu Amintas (tenho certeza que gostava dessa minha descontração). Pelo contrário! Ele não era meu ídolo, nem eu tinha dele uma visão idealizada. Ele era apenas o pai que eu amava, um pai que nos amava sem meias medidas e que me ensinou, pelo exemplo, a amar nossos filhos da mesma forma. Se já escrevi alguma coisa semelhante ao que vou contar, peço que me perdoem, pois é difícil me lembrar de tudo o que já saiu aqui no Blogson. Dito isso, vamos às lembranças.

Morávamos na casa de minha avó materna, junto com oito tios e tias, minha avó e meu avô. Duas crianças e doze adultos. Nessa época não havia ainda televisão em Belo Horizonte. Depois da "janta" (não consigo me lembrar do que comíamos à noite), ficávamos pentelhando por ali enquanto os adultos conversavam, até nossa mãe nos mandar dormir. Como não tínhamos outra opção, obedecíamos. Eu, meu irmão e nossos pais dormíamos no mesmo quarto, em um barracão (edícula) nos fundos da casa. A cama de casal ficava entre a minha e a de meu irmão.

Para nos manter deitados ou por outro motivo qualquer (saco cheio dos cunhados, por exemplo), nosso pai nos contava histórias. Começou com suas lembranças de infância, das empregadas de nossa avó, das traquinagens e peraltices (isso é só para dar um tom de antiguidade) cometidas por ele, seus irmãos e pelo primo Odilon. Falou também dos doidos mansos de Oratórios e Ponte Nova, dentre eles uma mulher meio desaforada e talvez já um pouco idosa, conhecida por "Sá Maria me Atende", que às vezes ia à casa de minha avó pedir esmola ou comida, se não me engano. Finalmente, falou das galinhas garnisés de pescoço pelado que eram para ele o suprassumo da beleza animal (apesar de serem uma das coisas mais feias). E, claro, contou sobre um carrinho ou charretinha que teve, puxada por um bode branco a que deu o nome de Cabritito.

Para nós, meninos presos, criados em cidade grande, aquelas histórias eram magníficas, melhores que qualquer conto das mil e uma noites ou coisa parecida. Assim, contrariando seu desejo provável de que dormíssemos logo, sempre pedíamos mais histórias. Até que as lembranças se esgotaram, pois já tinha contado tudo que poderia nos contar.

Foi aí que teve início a fase ficcional. Começou a inventar histórias com dois personagens de quadrinhos que eram publicados na revista "O Tico Tico" (é, moçada, sou velho pra caramba!): Faustina e Zé Macaco. Creio que eram histórias estilo bang bang ou filmes de caratê bem no estilo "filmes mudos do Carlitos", sempre com algumas porradas, chutes na bunda e bandidos sendo atirados longe depois de rodar sobre as cabeças, seguros pela heroína Faustina apenas por uma perna ou braço. Creio que o Zé Macaco não deu muito ibope e logo foi abandonado.

Mas as coisas ficaram realmente empolgantes quando essa dupla foi substituída pelo Cabritito e pela Sá Maria me Atende. Aí o delírio tomou conta das histórias (e ele nem bebia!), pois logo, logo o bode branco casou-se com a Sá Maria me Atende. E o mais bacana é o fato de ser ela a primeira super-heroína brasileira! Uma super-heroína desconhecida, caipira, louca, casada com um bode e que, além da força física descomunal, voava! E só eu e meu irmão sabíamos de sua existência.

Bom, aqui cabe um parêntese: na época d' O Pasquim, o Jô Soares escreveu um artigo divertidíssimo sobre os super-heróis criados pelo Stan Lee & companhia, lembrando que, ao contrário do Super-Homem, que voava sem nenhuma explicação plausível, toda a turma de super-heróis da Marvel tinha seus truques, a saber: o Homem-Aranha não voava, mas deslocava-se pendurado em uma teia fixada em algum canto dos quadrinhos; o Thor arremessava seu martelo (ou marreta, não é, Azarão?); o Capitão América jogava seu escudo como se fosse um bumerangue; o Surfista Prateado tinha uma prancha de matar de inveja os brothers; o Homem de Ferro tinha foguetes na armadura, o Namor tinha asas nos pés, o Hulk pulava a grandes distâncias e por aí afora.

Pois é, a primeira super-heroína brasileira voava, graças a um artifício bem funcional: batata-doce. Na iminência de pegar algum criminoso que tinha fugido (e que seria atirado longe depois de orbitar em volta dela, agarrado por um braço ou perna), a louca comia batata-doce e logo começava a peidar. Primeiro, um po po po contido, para logo pegar aceleração (Pruuum!) e Fium!!! - sair voando a jato (sem brincadeira, eu escrevi isso agora até chorando de rir!). Era quase impossível dormir depois dessas emoções!


Alguns anos antes de meu pai morrer, lembrando-me dos casos que ele nos contava, perguntei por que não escrevia aquelas lembranças de sua infância. Ele deu um sorriso entre surpreso e irônico e comentou que meu irmão tinha pedido a ele a mesma coisa. Aí eu insisti para que fizesse isso, mas ele comentou: - "Quem iria querer ler essas coisas?” E a resposta foi - “Eu (lógico!), meus filhos, meus irmãos, meus sobrinhos”!". Mas ele não se convenceu ou nunca quis fazer isso. Sinceramente, creio que naquela época, quando já havia perdido quase todos os irmãos, revolver e reviver suas lembranças seria como arrancar a casca de uma ferida que custou a cicatrizar e que ainda doía.

Aqueles casos tão saborosos, aquelas histórias ingênuas que embalaram meu sono de criança hoje estão cada vez mais esmaecidos na minha memória e, talvez, na de meus irmãos. Minha irmã, onze anos mais nova que eu, teve a gentileza de me enviar o registro de alguns dos casos reais (que ela também ouviu um dia), mas imagino que nunca soube das sensacionais aventuras de Cabritito e Sá Maria me Atende.

Olha ele aí, um híbrido de Stan Lee caboclo com Lewis Carroll caipira, em foto tirada na época de vacas gordas, quando eu nem tinha nascido ainda).



Sua benção, meu Pai, a benção, Seu Amintas!

(13/02/2016)

terça-feira, 28 de outubro de 2025

MENINO BOBO

Meu pai nasceu no jurássico ano de 1911, em São José dos Oratórios, antigo distrito de Ponte Nova. Isso significa que se ainda fosse vivo seria muito, muito velho, pois teria inacreditáveis 111 anos. Provavelmente sentiria orgulho de saber que seu amado distrito transformou-se no município de Oratórios, com a gigantesca população de 4.486 habitantes, segundo o censo de 2010.
 
Às vezes me pergunto como teria sido sua infância naquele cu de mundo (que ele amava), pois me lembro de pouca coisa que contou sobre essa época. Passados tantos anos, é necessário muito esforço para tentar imaginar a vida levada por um menino na faixa dos sete aos onze anos, em um distrito de uma cidadezinha do interior mineiro, no início do século XX, um lugarejo com população que talvez não chegasse a mil almas.
 
Sei que tinha uma carrocinha puxada por um bode branco (a que deu o nome de "Cabritito"), achava a coisa mais linda uma repulsiva galinha garnizé de pescoço pelado, devia andar descalço, nunca aprendeu a nadar, soltava pião, coisas assim. Outra lembrança é a reprodução de um ditado local, uma espécie de "Lei de Murphy caipira", que estabelecia que "menino bobo é que acha canivete".
 
Meu pai explicava essa "lei probabilística", dizendo que naquele fim de mundo, a melhor coisa que um garoto esperto podia desejar possuir era um canivete, tantas as utilidades que podia ter. Assim, encontrar um canivete que alguém teria perdido era como ganhar na loteria, uma possibilidade remota, aparentemente reservada apenas aos meninos idiotas, ignorantes de suas múltiplas aplicações.
 
Mas quais seriam essas utilidades? Descascar laranjas certamente seria uma delas. Cortar e afeiçoar uma forquilha de goiabeira para fazer estilingue (ou bodoque) seria outra. Fazer entalhes em madeira, talvez. Que mais, que mais poderia ser feito? Sinceramente, não consegui imaginar mais nada, sinal claro de que se eu tivesse vivido naquele lugar, naquela época, fatalmente teria achado um canivete. Pensando bem, um só não, talvez dois ou até mais. 

segunda-feira, 27 de outubro de 2025

QUE SIGNIFICA ANTI-LUÉTICO?


Na minha infância, várias vezes ouvi meu pai falar de “Tapayuna”, nome escolhido para um produto criado por seu irmão mais velho, um apaixonado pela mística dos nomes e temas indígenas. Imagino ter sido esse medicamento o carro-chefe dos produtos fabricados pelo laboratório farmacêutico de propriedade da família.
 
Meu pai até guardava um recorte de jornal que – além da foto em que ele aparecia ao lado da Emilinha Borba, tirada quando ela se apresentou em BH, no auge de seu sucesso –trazia ainda uma declaração da cantora louvando os benefícios do remédio. Segundo ele me disse, tratava-se de notícia paga. O engraçado é que minha mãe tinha ciúmes desse encontro, um contato que provavelmente não deve ter durado mais que cinco minutos.
 
Esse recorte provavelmente está com meu irmão, que fez uma limpa nos papeis guardados por nosso pai, depois de sua morte. Da mesma forma, estão com ele rótulos que descobriu no meio da papelada, usados nos demais produtos fabricados no laboratório da família. Quando ainda nos falávamos, ele disse que faria pastas com esses rótulos e daria uma para mim e outra para nossa irmã. Vou ver se me lembro disso quando nos falarmos no "Centro Espírita Oriente".
 
Recentemente, na falta de coisa melhor para fazer, resolvi tentar achar na internet alguma coisa relacionada ao tal “elixir" Tapayuna. Pesquisei, pesquisei e não encontrei nada, mesmo tratando-se de um produto que teria sido anunciado na parte interna dos bondes que circulavam pela cidade.
 
Pois bem, de tanto insistir, acabei achando a transcrição de duas páginas do Diário Oficial da União com pedidos de registro de marcas comerciais, etc.. Nessas páginas são mencionados o Tapayuna e o nome de meu tio.
 
Pelo que  pude observar, deve ter sido utilizado o OCR no processo de escaneamento dos originais, pois nos textos há várias letras trocadas em virtude de sua semelhança, tipo “r” e “n”.
 
O curioso dessa história é que acabei descobrindo se não o nome comercial, pelo menos para que servia o tal “elixir”: “Anti-Luético Tapayuna”. Segundo o Dicionário do Aurélio, "luético" é um adjetivo "relativo à, ou da natureza da lues". E "lues" é sinônimo de sífilis. O Tapayuna era um medicamento para tratamento de sífilis!
 
E aqui cabe um comentário: embora não saiba quando começou sua comercialização, o registro da marca do produto foi concluído em 1938. Já a penicilina, descoberta em 1928 e primeiro antibiótico realmente eficaz no tratamento dessa doença, só ficou disponível (segundo a Wikipédia) para uso em massa no ano de 1941. Imagino que meu pai e seus irmãos, com o sucesso e eficácia da penicilina, devem ter ficado com aquele gosto de gol anulado, pois "perderam o jogo".
 
Em 1950, ano em que nasci, creio que o laboratório já tinha ido para o espaço, levando junto com ele as finanças e os sonhos dos irmãos. E eu já nasci pobre.
 
Tio Delvaux morreu em 1964, aos setenta anos. Palavras de minha irmã: "Por todas as informações que consegui obter (...) deduzo com bastante probabilidade que ele, tio Delvaux, depois da recessão pós-guerra que culminou na falência dos negócios, desenvolveu um depressão severa que na Medicina chamamos Transtorno Depressivo Maior e não se recuperou mais".
 
A título de curiosidade, as imagens "print screen" das informações que consegui encontrar na internet:







domingo, 26 de outubro de 2025

COISAS DE ORATÓRIOS

Meu pai nasceu em Oratórios, mais precisamente em São José dos Oratórios, na época em que esse município ainda era apenas um distrito de Ponte Nova. Saiu de lá na década de 30, creio, mas guardou sempre uma lembrança carinhosa de sua terra. De tal forma, que quando mencionei que o João Bosco, compositor nascido em Ponte Nova, havia gravado uma música com o nome de “Das Dores de Oratórios”, meu pai espantou-se:

 Não é possível! Será que é mesmo a minha querida Oratórios?

Era. Dei a ele o disco que continha essa música. A bem da verdade, não era uma música para se gostar de imediato. Falava de uma noiva que foi abandonada no altar, enlouquecendo a partir daí. Trajando o que restou do vestido de casamento, ficava gemendo e gritando pela cidade.


Quando eu e meu irmão éramos crianças, nosso pai nos contava histórias incríveis enquanto nos colocava para dormir. Começou contando casos de sua infância e acabou com histórias mirabolantes inventadas por ele. Para nós isso não fazia a menor diferença, porque tudo parecia ser a narrativa saída de um livro de aventuras, tal sua dessemelhança com nossa vida de crianças de cidade grande cercadas e controladas por onze adultos.

Minha irmã, onze anos mais nova que eu, também ouviu esses casos. Meu pai era um bom contador de histórias mas, talvez, a explicação do encanto e diversão proporcionados por esses casos antigos esteja nesta frase ouvida recentemente (infelizmente, desconheço o autor): “nada é mais estranho que o passado recente”.

Finalizando essa não tão pequena introdução, preciso dizer que a maioria dos casos ouvidos por nós dissipou-se como fumaça, como a fumaça do tempo que passou. Por isso, relembrar alguns desses casos ingênuos, divertidos e antigos que já tinha esquecido, me deixa feliz. Porque parte do que sou hoje veio lá de São José dos Oratórios, veio da família de meu pai, de seus costumes, de sua esquisitice e de sua forma peculiar de relacionar-se com o “mundo exterior”. Para isso, vou usar e abusar da memória e das descrições encaminhadas por minha irmã, que conviveu muito mais tempo com nosso pai. Vamos lá:


DO TEMPO DA ESCRAVIDÃO
“Papai me contava algumas histórias dos escravos do avô dele (pai da vovó Vita): quando ocorreu a abolição, eles imploraram para continuar na fazenda porque não queriam ir embora de jeito nenhum – e realmente continuaram lá. Segundo relatos de nossa avó, esses escravos eram tratados com consideração, como se fossem empregados e não escravos. Uma das histórias que eu mais gostava de escutar era a de um escravo velho e meio amalucado: no dia em que ele cismava que era feriado não tinha ninguém que o convencesse do contrário. Punha uma garrafa de cachaça debaixo do braço e ia às fazendas da vizinhança provocar ‘os colegas que não estavam de folga’. Isso dava uma confusão danada para o nosso bisavô, que depois tinha de apaziguar a fúria dos demais fazendeiros, porque o tal escravo perturbava o trabalho dos outros. Segundo papai, nossa avó contava esse caso com muita simpatia e muita ternura porque gostava muito do preto.

Quanto à família do vovô Augusto, imagino que talvez tivesse um perfil abolicionista, porque não me lembro de relatos desse tipo de história; ao mesmo tempo, lembro-me vagamente de menção à revolta de nosso avô frente a situações de desumanidade. Papai dizia sempre que seu pai era um homem extremamente correto e justo e não mentia em hipótese alguma, doesse a quem doesse, embora fosse muito amoroso”.


SÁ GERMANHA E SÁ GENOVEVA
“Sá Germanha (Germania) e Sá Genoveva eram empregadas da casa deles e, provavelmente, irmãs. Uma delas dizia que quando ia a um ‘baile’, levava um almanaque; assim, quando algum ‘cavaiero’ a convidava pra dançar, ela agradecia e recusava delicadamente explicando – ‘não posso, estou estudando’. E papai acrescentava que o almanaque devia estar de cabeça pra baixo, porque ela não sabia ler.

Uma delas, quando ia à cidade fazer compras, às vezes voltava vitoriosa contando a negociação que tinha realizado. Era alguma coisa como – ‘acha que eu sou boba de comprar isso por cinco réis (ou coisa parecida)? Eu levo se o senhor deixar por dez!’ E o comerciante muito generosamente e em consideração à ‘clientela fiel’, concordava!

Um dia, quando uma delas estava na cozinha com uma conhecida, um dos tios entrou e perguntou se o ‘coffee’ estava pronto e ela respondeu que já estava saindo. Outro tio surgiu e ela informou que o café estava pronto, ao que ele respondeu: – ‘oh! muchas gracias!’. A amiga, boquiaberta, perguntou se ela entendia o que eles diziam e ela muito importante esclareceu: – ‘ah minha filha, pra trabalhar aqui nesta casa, tem que falar muitas línguas’.”


ZÉ MAMÃO
“Sei que morava em Oratórios e papai falava dele com muita simpatia. Ele gostava muito da família do papai e ia com muita frequência na casa ou venda deles. Uma vez ele apareceu com uma mala velha de couro e foi se despedir porque estava indo embora para Ponte Nova ou sei lá onde. Tio Delvaux então com muita conversa e psicologia o convenceu a desistir do intento, usando argumentos ‘fortes’ ao dizer como todos na cidade ficariam muito tristes com a ausência dele e que não achariam ninguém para substituí-lo nas ‘funções imprescindíveis que ele executava tão bem’, funções essas que eu não lembro bem, mas eram umas coisas bem malucas. E Zé Mamão, muito comovido, desistiu de ir embora e abriu a mala para que o Tio Delvaux visse as preciosidades que ele ia levar: uns carretéis de madeira vazios, umas latinhas, uns vidrinhos sem tampa e um pedaço de fumo de rolo. Aí foi a vez do Tio Delvaux ficar comovido com tamanha inocência. Outros tempos, né?”


NADANDO NO RIO
“Segundo papai, algumas vezes, ele, Tio Nhô, seu primo Odilon e outros amigos iam para a beira do rio fumar escondido. Quem sabia nadar, aproveitava a ocasião pra se refrescar; um desses era o Odilon.

Papai dizia (e mamãe também confirmava) que seu primo era moleque demais. Em um desses dias, depois de ter nadado bastante, montando na bicicleta todo molhado e, diga-se de passagem, nu e com o cigarro no canto da boca, começou a fazer demonstrações das habilidades ciclísticas. Só que justo nessa hora, passa a jardineira (ônibus) das moças do colégio interno e com as freiras também, que dão de cara com a cena: Odilon pedalando a bicicleta, pelado e de cigarro na boca.

Papai contava que foi aquele alvoroço, as freiras horrorizadas tentando tapar os olhos das moças e algumas mais assanhadas olhando animadamente com risinhos disfarçados e irônicos.”


O PRIMEIRO AUTOMÓVEL
“Papai contava que em determinado dia chegou o primeiro automóvel em Oratórios e, como era de se esperar, causou imenso rebuliço. Todos os moradores, boquiabertos, querendo ver de perto aquela preciosidade. Era um carro alemão (papai dizia a marca, mas eu não me lembro).

Como ninguém sabia dirigir, resolveram chamar certo indivíduo, muito ‘gabaritado’ por ter morado algum tempo no Rio de Janeiro. O problema é que o sujeito também não sabia dirigir, mas não podia dar o braço a torcer. Como dizia papai, “montou no carro e ligou a ignição” e saiu dando arrancos e mais arrancos e fazendo um barulhão, em meio ao espanto e entusiasmo geral.

Quando alguém com um pouco mais de sensatez perguntou ao ‘experiente motorista’ se era daquele jeito mesmo, ele respondeu categoricamente que sim, porque aquele era um carro alemão e os alemães são assim mesmo, ‘muito bruscos’”.


“O SECRETÁRIO MODERNO”
“Outro caso de que me lembrei foi o de um amigo do Tio Lourival que ficou hospedado na casa dos nossos avós alguns dias. Esse amigo estava radiante com um livro que havia adquirido. O título era ‘O Secretário Moderno’ e o livro apresentava modelos de cartas para várias situações. Quando partiu, despediu-se calorosamente de todos, principalmente do amigo Lourival, agradecendo a hospedagem.

Pois bem, pouquíssimos dias depois, Tio Lourival recebeu uma carta desse amigo com os seguintes dizeres (imagino que devia ter um prezado ou caro ou algum outro pronome de tratamento):

‘Lourival,
Qual o motivo do teu silêncio?' 

E papai completava  ‘ele devia estar doido para estrear o livro, mas não conseguiu encaixar o Lourival em nenhum dos modelos de carta. Não encontrando outra opção, não se deu por rogado’.
Fico imaginando a cara do Tio Lourival, que era muito irônico, lendo a carta.”


LINGUIÇA NO FUMEIRO

Imagino que no início do século XX todas as casas mais simples possuíam um fogão de lenha. Também existia um na casa de meus avós paternos, em São José dos Oratórios (distrito de Ponte Nova). Pendurado sobre o fogão havia um pau roliço, onde se colocava parte da produção caseira de linguiças, que iam sendo defumadas graças ao calor e à fumaça da lenha queimada para o preparo das refeições da família.

E é aí que entra a protagonista deste caso: uma mulher meio louca, meio desaforada e talvez já um pouco idosa, às vezes ia à casa de minha avó pedir esmola ou comida, se não me engano. Pelo menos para meu pai e seus irmãos era conhecida por "Sá Maria me Atende" (a súplica transformada em apelido!).

Creio que em um dia qualquer, Sá Maria entrou na casa, provavelmente pela cozinha, e pediu comida. Uma de minhas tias, talvez desejando verdadeiramente ajudar a coitada, ofereceu trabalho a ela. E a surpresa veio com a resposta dita de forma irônica e lírica, dizendo que aceitava galinha assada e "linguiça no fumeiro", mas de trabalho estava fugindo. E nunca mais voltou a por os pés na casa de minha avó. É uma historinha boba? Certamente que é, mas a frase esquecida é que daria sabor a esse "causo", talvez um sabor de linguiça caseira defumada lentamente.


FALANDO FRANCÊS
“Trata-se do filho de um dos moradores do distrito; o pai era frequentador e freguês do armazém de nosso avô Augusto. Homem muito humilde, trabalhador rural e que tinha muita estima pela família do papai, no final do dia, depois da lida, ia para o armazém conversar fiado, fumando cigarro de fumo de rolo e provavelmente tomando uma pinguinha, como muitos outros. 

Pois bem, esse homem simples tinha um filho que foi mandado para um seminário como auxiliar de serviços e adquiriu algum estudo por lá. Teria sido enviado para esse seminário por intermédio de algum patrão do pai com a intenção de ajudar na educação do rapaz. De tempos em tempos o rapaz voltava à casa paterna, talvez em período de férias e o pai, muito orgulhoso,ao exibir o talento de seu primogênito, aparecia no armazém geralmente em dia e horário de maior movimento, para que mais pessoas pudessem apreciar o espetáculo. E começava ordenando ao filho que pedisse o primeiro item da lista de compras apontando para o saco de arroz. O “crioulinho” (era assim a referência ao elemento) na maior desenvoltura, pedia em alto e bom som (vou escrever do jeito que se pronunciava):

 ‘Done moá an quilô de arrozê’.

(Entenda-se: done moá an quilô = donne-moi un kilo...)
E o pai, orgulhosíssimo, olhava ao redor para ver a impressão causada nos demais, igualmente encantados e boquiabertos. E assim o filho prosseguia com os outros itens. Feijão virava feijô, fubá virava fubê, farinha era farinhê na boca do picareta. E ouvindo o filho falar "francês", o pai, não se contendo de emoção, já engasgado com toda aquela erudição, ordenava o último item e o rapaz, sem pestanejar:

 ‘Done moá ine rapadurê’.

Em vista disso, o pobre homem prorrompia em pranto e, entre lágrimas, exclamava:

 ‘Ele fala um francêis tão ispivitado, que até eu, que sou anarfabeto, entendo!

E papai concluía de forma solene e irônica: ‘Coisas de Oratórios!’ Mamãe sorria e balançava a cabeça como quem diz ‘nunca vi tanta bobagem’”.

* * * * *

Este texto é uma homenagem a meu pai, nascido em 1911, em um dia de Finados. Por ter acompanhado o enterro dos pais e de quase todos os irmãos (era o segundo mais novo), ele odiava essa data, ocasião em que trancava-se em um quarto, imagino que entregue às lembranças da família. E só permitia a entrada dos filhos.

É também um agradecimento público à minha irmã, pela paciência e empenho em lembrar e escrever esses casos para mim.

sábado, 25 de outubro de 2025

DORMINDO PROFUNDAMENTE

Este post é mais um adendo ou anexo, pois não fazia parte do texto que escrevi para meus filhos. Resolvi fazê-lo para encerrar a série "Século... vírgula..." sobre a família de meu pai, depois de receber três presentes de minha irmã.

ÁLBUM DE RETRATOS
O primeiro presente foram os retratos que ela me enviou por e-mail. Fiquei fascinado com as fotografias. Sinceramente, gostaria de apresentar os tios sem a beca de formatura, mas não consegui as fotos 3 x 4 de todos. O TOC me impediu de usar quatro fotos normais e só uma com beca. As fotos das tias são mais recentes, tal como eu me lembro delas. E a ordem, claro, é coerente com a data de nascimento de cada um. O casal que aparece em uma foto esmaecida são meus avós paternos - Vovó Vita e Vovô Augusto (Sô Gusto). Esse retrato tem mais de setenta e cinco anos, pois quando eu nasci meu avô já tinha morrido.

Curioso é o fato de todos os homens terem estudado medicina e todas as mulheres farmácia. É claro que alguma coisa deu errado nessa história, pois nenhum dos homens exerceu essa profissão! A minha dedução é que aconteceu com meus tios o mesmo que com meu pai: estudaram medicina só para agradar os pais. 

Não faz muito tempo, inexistia a separação nítida de cursos universitários tal como é hoje. Tive um colega cujo título era engenheiro civil-eletricista. Minha mãe tinha um cunhado cujo título era engenheiro-arquiteto. Assim, imagino que, na época de meus tios, quem se formava em medicina estava automaticamente habilitado em farmácia. Foi o que aconteceu com meu pai.

Aliás, há mais uma curiosidade: durante o Estado Novo, se não me engano, os farmacêuticos foram autorizados a registrar-se como químicos, para suprir uma mão de obra inexistente e necessária aos esforços de industrialização do país. Dessa forma, meu pai tinha a formação de médico, farmacêutico e químico (profissão que realmente exerceu). 

Esse colar de títulos universitários não o impediu de viver duro a maior parte da vida, sempre às voltas com agiotas. E o motivo, creio, é bem simples: com a morte de dois dos irmãos mais velhos e a quebra dos negócios da família, sobrou para os remanescentes o pagamento de dívidas e encargos, situação bem na linha da frase -"segura no pincel aí que eu vou tirar a escada”.

QUADROS
Na mesma linha homenagem-memória dos textos anteriores, apresento duas imagens do "quadro dos carneiros" mencionado no post anterior ("SÉCULO VINTE VÍRGULA TRÊS"). A primeira resultou de uma foto tirada (ficou com reflexo do flash) por minha cunhada e tem as cores originais da pintura. A segunda é a cópia que está hoje na casa de minha irmã. Como pode ser visto, as cores não correspondem às originais.



NO PAÍS DOS BANGUELAS
Recentemente, minha irmã perguntou se eu queria uma maletinha que pertenceu ao pai de meu pai. Acho que a resposta que dei é óbvia, não? Aceitei na hora, lógico!

Além de toda desmontada e comida de cupim, trazia uma curiosidade: na parte interna (apesar dos cupins), estavam preservados os "berços" das ferramentas que ali estiveram acondicionadas. As formas das ferramentas eram visualizadas ou intuídas facilmente. E eram alicates, boticões e ferrinhos de dentista!

Como meu avô era dono de armazém... em um distrito de Ponte Nova... no final do século XIX / início do século XX... só posso pensar que, às vezes, talvez exercesse também essa atividade naquele fim de mundo. O que teria suas vantagens: antes de extrair o siso de alguém, já vendia logo o anestésico (cachaça, claro).

NASCIDOS NA FAZENDA - 04

Eu terminei a terceira parte desta série de lembranças falando de um sujeito que tinha um apetite sexual do tamanho da Muralha da China. ...