Salvo no caso de fusões de empresas já existentes, todas as construtoras começaram fazendo reformas prediais, construindo casas ou pequenas obras. Muitas vezes, graças à indicação de parentes e amigos. Normalmente, os sócios são engenheiros novos e recém-formados, com muita coragem e garra, mas pouca ou nenhuma experiência.
Eu mesmo sonhei ser um desses, mas faltou-me "coragem e garra". Ter-me tornado pai aos vinte e seis anos e a inexistência de parentes ricos para dar apoio e suporte em caso de necessidade fizeram com que esse desejo, que esse sonho permanecesse apenas isso: sonho. Por não ter espírito empreendedor, hoje eu vejo que não errei por não ter tentado. Talvez, se tivesse montado uma construtora, teria caído na vala comum da maioria dessas "gatinhas" (nome mineiro para as pequenas empresas de engenharia), ou seja, teria quebrado ou fechado simplesmente. E condenado minha mulher e filhos a muita privação.
Além da gestão amadorística e deficiente a que normalmente estão sujeitas no início, acredito que as pequenas construtoras estão expostas a um risco muitíssimo maior que, por exemplo, uma pizzaria recém-inaugurada ou uma pequena loja de autopeças ou sei lá o que. E esse risco está relacionado à formulação do preço da obra que se pretende executar. Embora utilize-se a expressão "indústria da construção", não há nada mais despadronizado que a construção de qualquer obra. A começar pela localização (que pode afetar o preço de frete dos materiais básicos utilizados. Além disso, o subsolo existente define essa ou aquela fundação. Pesam ainda a quantidade absurda de materiais diferentes necessários, sejam eles incorporados à obra ou apenas como auxiliares durante os processos construtivos. Fora atrasos de pagamentos, ações trabalhistas, mudança de projetos, etc. etc. etc. etc. ...
Ainda que este início esteja mais árido que areia lavada, de leitura mais penosa que andar descalço em pedra britada, de avanço mais duro que concreto armado, já aviso a quem sobreviveu até agora que o texto deve melhorar um pouco.
Porque a questão básica que se impõe aos empresários frescos (é bom deixar claro que todos os engenheiros são machões. Até mesmo algumas engenheiras) é: como ganhar dinheiro (ou lucrar) fazendo obras por empreitada? Repetindo: qual deve ser o preço que bem atenda contratado e contratante?
Se houver licitação, aí é que o caldo entorna. Do primeiro gerente a que fui subordinado, ouvi uma afirmação que nunca esqueci. Em uma conversa com um grupo de engenheiros do qual eu fazia parte, o sujeito disse de forma bem humorada que uma proposta comercial onde nada foi esquecido certamente leva uma construtora a perder a licitação da qual participa. E repetiu sorrindo: – “se não esquecer alguma coisa, não ganha a obra”. E a explicação é simples: como ninguém quer perder dinheiro, o bom senso recomenda que se adote um percentual para prevenção de custos imprevistos. Se essa "vacina" for aplicada indiscriminadamente em toda a proposta, o resultado provável é a perda da licitação (por over dose).
Essa construtora onde trabalhávamos era uma
empresa extremamente ética e jamais participava de “acordos” (entre
empreiteiras) para definição prévia de quem ganharia a obra, uma prática
extremamente comum na área de obras públicas naquela época e, provavelmente,
hoje ainda (alguém se lembrou do Petrolão? Pois é). Talvez por isso, essa
excelente empresa só trabalhasse fazendo obras para indústrias e outras
empresas privadas. Por manter-se fiel a essa filosofia, permaneceu uma empresa de
médio porte. Em compensação, graças ao cuidado e interesse de seu fundador por
práticas administrativas modernas e controle rigoroso de custos, serviu de modelo para, pelo menos, cinco
novas empresas de engenharia, fundadas por profissionais que tinham pertencido
ao seu quadro de engenheiros.
Anos depois, já em outra construtora, ouvi do presidente da empresa, um senhor calmo e ponderado, a frase: –“nunca perdi dinheiro por deixar de fazer uma obra”. Sábias palavras. Porque estou dizendo isso? Para falar de corrupção, propinas e práticas nada “cristãs”. Mas, como o caminho é longo, vamos devagar.
Anos depois, já em outra construtora, ouvi do presidente da empresa, um senhor calmo e ponderado, a frase: –“nunca perdi dinheiro por deixar de fazer uma obra”. Sábias palavras. Porque estou dizendo isso? Para falar de corrupção, propinas e práticas nada “cristãs”. Mas, como o caminho é longo, vamos devagar.
Na minha opinião, quando se elabora uma
proposta para executar determinada obra, assume-se um risco muito alto, maior que o normalmente existente em outros setores da economia. E são
vários os motivos para isso:
- na fase da licitação, o projeto apresentado
pode estar incompleto, mal detalhado ou com erros - ou é de responsabilidade da
empresa que for contratada;
- salvo casos muito especiais e pouco
frequentes, nenhuma obra é igual a outra. Assim, as experiências e dificuldades
vividas na primeira obra de quase nada valerão para a realização da segunda;
- atrasos no recebimento das faturas
correspondentes às parcelas já executadas podem, em alguns casos, até quebrar
uma construtora de pequeno ou médio porte;
- no caso de obras públicas, embora "raro"(?), não
chega a surpreender que haja pagamento de propinas feito a achacadores ligados
à fiscalização da obra (alguém se lembrou do Petrolão? Pois é).
Por volta de 1977, praticamente
recém-formado, ouvi do diretor de uma pequena construtora a seguinte história:
essa empresa tinha ganho na maior lisura e pelo menor preço uma pequena obra em
um município da Grande BH. Embora rigorosamente dentro do cronograma, não
havia meio de receber em dia os pagamentos pelos serviços já executados. Queixando-se da dificuldade em receber as faturas em dia com um
amigo que era dono de outra pequena construtora, esse diretor foi instruído a procurar
alguém muito graduado na Administração Municipal. O assunto a tratar seria a concordância
em pagar uma propina de 2% de cada fatura recebida, uma espécie de "corretagem",
para que sua empresa pudesse receber em dia. Depois de fazer isso, nunca mais
recebeu atrasado. Detalhe: metade da extorsão era destinada ao prefeito.
A outra parte era distribuída entre alguns secretários. Comovente, não?
O que uma pequena construtora pode fazer para que seu
barquinho possa continuar flutuando nesse oceano tempestuoso? No caso específico, mesmo arriscando-se a perder a concorrência o que esse empresário fez foi passar a incluir essa "corretagem" em toda proposta que apresentava para outras licitações nesse município, com o consequente aumento no valor final. Edificante, não?
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